Academia
Maçônica de Letras Sul-Rio-Grandense
A
Revolução Solar: de Alcides a Héracles
Cadeira nº 10
Francisco Lobo da Costa
Francisco Lobo da Costa
Porto Alegre, setembro de 2017
A Revolução Solar: de Alcides a Héracles
“A grande aventura existencial consiste em
empreender uma longa jornada e depois de terminá-la chegar ao mesmo ponto de
origem e admirá-lo como se fosse a primeira vez que o vê”.
Marcel Proust na
obra Em Busca do Tempo Perdido
1.
A História ou a
estória antes ou para além dos trabalhos
A história ou a estória de Héracles
(cuja romanização legou a expressão Hércules) é a epopeia simbólica da alma
humana em busca de sua libertação dos grilhões dos vícios de caráter e é
contada pelo menos desde 3.000 a.C. A sucessão de trabalhos, ou tarefas, que a
uma primeira vista se demonstra verdadeiro drama acaba por traduzir algo para
além da dor recorrente das derrotas dramáticas relatadas na jornada. Os
trabalhos evocam, apesar do drama, verdadeira tragédia, onde o herói sucumbe e
se levanta a todo o momento, deixando para trás suas falhas e seguindo
fortalecido, sem negar suas fragilidades, em direção às vitórias sobre si
mesmo. Sim, o “si mesmo” é o maior inimigo de Hércules à despeito de toda
adversidade que se apresenta nas tarefas.
“A
descrição de suas tarefas, a história dramática de seus fracassos e conquistas,
demonstram a mesma luta que enfrentamos nos dias de hoje em nossa própria
evolução, pois, certos acontecimentos e episódios retratam, em qualquer época,
a natureza do treinamento e realizações que caracterizam o ‘Caminho’ de
qualquer homem que busca e se aproxima de sua ‘Libertação’. ” (NETTO, s.d.)
Os trabalhos de Héracles, tão
imemoriais quanto a própria cultura grega, possuem na Heracleia (ou Herácleda), poema épico perdido e escrito por
Peisandro de Rodes em aproximadamente 600 a.C., um dos seus registros históricos
mais antigos. Contudo, crê-se que a coletânea de trabalhos hoje existentes foi compilada
de diversas fontes, tese evidenciada especialmente porque as narrativas possuem
pouca coerência, inclusive geográfica, entre si.
A narrativa de fundo da epopeia de
Héracles começaria muito antes. Tomado por um episódio de cólera, fomentado
pela ciumenta deusa Hera, Alcides (primeiro nome de Héracles, que significa
“aquele que atrai as ideias”) matou os três filhos que havia com Mégara.
Sentindo-se culpado pelas mortes, Alcides busca orientação junto ao famoso
Oráculo de Delfos. A sentença expiatória do Oráculo foi a de que Alcides
precisaria realizar doze façanhas sobre-humanas ordenadas por seu primo Eristeu
(cujo significado é “aquele que te faz encontrar”), rei de Micenas. Naquela
ocasião Alcides teve o nome trocado para Héracles, que significa “à glória de
Hera” ou “aquele que vai em direção ao heroico”. Foi a pitonisa de Delfos quem
primeiro chamou o heroi de Héracles, até então ele era conhecido pelo nome de
Alcides.
Netto (s.d.), sugere uma outra
explicação ao nome de Hércules: “Hércules era o nome de sua Alma, enquanto
Herakles do homem material; o primeiro nome era a expressão de sua origem
paterna divina – o Espírito, enquanto o segundo era a expressão de sua origem
materna humana – a Matéria. Daí a simbologia de semideus. ”
Alcides era filho da rainha Alcmena (ou
Arkmene) e Zeus (que a seduzira). A esposa de Zeus, a deusa Hera, enciumada
pela traição do rei dos deuses olímpicos, tenta se livrar do jovem Héracles
enviando duas serpentes venenosas. O bebê, semideus, pega as serpentes e ao
aperta-las fortemente acaba por mata-las.
Assim, Alcides foi criado por aquele que pensava ser seu pai, o rei
Anfitrião.
Porém, ao que parece, o título de
Héracles (ou Hércules) concedido a Alcides parece remontar à uma época muito
mais pretérita:
“Muitos
séculos antes da época na qual se diz ter vivido o filho de Alcmena, ou o
pretenso herói de Tirinte, o Egito e a Fenícia, que certamente não foram à
Grécia buscar os deuses que adoraram, tinham levantado templos ao sol sob o
nome de Hércules, e levado o nome deles à ilha de Tasos e Cádiz, onde também
havia se consagrado um templo ao ano, e aos meses que o dividem em doze partes,
isto é, aos doze trabalhos ou às doze vitórias que deram à Hércules a
imortalidade. ” (URBANO JR., 2012, p. 433)
Nesta
linha, o arquétipo de Héracles encontra ainda referência junto aos antigos
egípcios que, segundo Plutarco, acreditavam que Hércules tinha sua sede no sol
e que nele viajava em torno do mundo.
A sequência canônica dos trabalhos
advindos da consulta ao Oráculo está consolidada, segundo Ribeiro Jr (1998) pelo
Pseudo-Apolodoro na sua Biblioteca e traz algumas
peculiaridades: “(...) os seis primeiros trabalhos foram realizados na própria
Grécia, mais especificamente no Peloponeso; os seis últimos levaram o herói ao
‘estrangeiro’ e alguns deles a lugares muito distantes e puramente míticos. ”.
A mais antiga fonte aos trabalhos de
Héracles se encontra na Ilíada (8.362-9),
onde o personagem é classificado como um semideus caçador de leões.
Amplamente representado na iconografia
clássica, seja nos templos ou ainda nos vasos, Héracles enquanto arquétipo do
homem em busca da evolução, se populariza no fim da Idade Média e no início do
Renascimento segundo Ribeiro Jr. (1998) em diversas obras literárias, “(...)
como o romance em prosa poética Le Fatiche d'Ercole, de Pietro Bassi (1475), o
texto em prosa de Don Enrique de Villena, Los Doze Trabajos de Hercules
(Zamora, 1483 e 1499), o romance anônimo Les Prouesses et vaillances du preux
Hercule (Paris, 1500), logo traduzido para o inglês, o poema Dodeci Travagli di
Ercole, de J. Perillos (1544) e uma coleção de adágios e alegorias de Fernandez
de Heredia, Trabajos y afanes de Hercules (Madrid, 1682).”
Sua lenda representa a luta de toda
Alma que, vencidas as etapas iniciais da evolução comum, candidata-se à
evolução consciente dos Iniciados, a qual levaria à imortalidade prometida na
profecia da pitonisa de Delfos.
“O
significado de um ‘Iniciado’, ou ‘Aspirante a....’ corresponde à etapa final da
evolução na qual o Homem, ainda imperfeito, toma em suas mãos,
intencionalmente, sua evolução e impõe a vontade de sua Alma sobre sua natureza
inferior ou material. Seu trabalho consiste em libertar-se dos laços maternos
(a Matéria), para assim responder ao amor do pai (o Espírito). ” (NETO, s.d.)
A
epopeia de Hércules, em torno dos doze signos do zodíaco, pode ser analisada à
luz do simbolismo maçônico igualmente expresso pelas colunas zodiacais do
Templo e também pelas constelações dispostas no teto.
2.
Noções
preliminares sobre os doze trabalhos.
O número doze simbolicamente remete a um
ciclo completo, ou seja, à totalidade de um processo ou grupo de elementos. Os
doze trabalhos de Héracles se organizam em torno de uma jornada pelos signos
zodiacais e a tradição optou por analisar cada um dos trabalhos à aprendizagem
vinculada ao signo do Zodíaco do qual faz parte.
Em linhas gerais pode-se afirmar que os
doze signos do Zodíaco representam o conjunto de características ou qualidades
da expressão humana, o que se pode denominar de “homem cósmico” em termos
astrológicos.
Toda a narrativa dos doze trabalhos
merece uma trina interpretação: literal (histórico mitológica), figurada (ou simbólica)
e secreta (ou mística), especialmente porque há diferentes ordenações dos
trabalhos a partir de diferentes autores. Aqui se opta pela compilação e
ordenamento proposto por Bailey (2008).
Historicamente, como foi dito, o
registro dos trabalhos invariavelmente remete ao poema sagrado denominado Herácleda,
que canta as tarefas do herói ou ainda os trabalhos do sol solsticial. Sim, os
doze trabalhos, de forma figurada, rendem homenagem ao sol, o qual Urbano Jr.
(2012, p.433) denomina de “astro poderoso que anima e fecunda o universo;
aquele cuja divindade em toda a parte de honrou com templos e altares. ”.
Nos Trabalhos,
obra de Hesíodo há importante referência zodiacal a Héracles:
“(...) o zodíaco, no qual o sol completa
seu curso anual, é o verdadeiro caminho percorrido por Hércules na fábula dos
doze trabalhos, e que pelo seu casamento com Hebe, deusa da juventude,
casamento que se realiza depois de terminado o movimento anual, deve
estender-se a renovação do ano, no fim de cada revolução. ” (AUBRETON, 1956)
Esta revolução zodiacal, que marcava o
lapso de um ano, igualmente, por sua data de início, também assinalava a época
de início dos jogos olímpicos, os quais se supunham terem sido instituídos por
Héracles.
O conteúdo do poema sagrado ultrapassa
em muito a literalidade crível e oscila entre
o sentido figurado e o místico, tomando uma dimensão superlativa
conforme anuncia Urbano Jr. (2012, p. 440): “ (...) todos os animais celestes
postos em cena neste poema aparecem com um caráter que sai dos limites
ordinários da natureza: os cavalos de Diomedes devoram homens; as mulheres
elevam-se acima da timidez do seu sexo, e são formidáveis heroínas em seus
combates; os pomos são de ouro; a corça tem pés de bronze; o cão Cérbero é
eriçado de serpentes. Tudo, até o próprio caranguejo, é formidável no poema, e
por quê? Porque tudo na Natureza é grande, bem como os símbolos sagrados que
lhes exprimem as diversas forças. ”
Assim, fica evidente que os fatos
descritos nos trabalhos não foram históricos, mas sim astronômicos ou astrológicos,
em que pese seu pretenso objetivo tenha sido o de, pela expressão artística
poética, comunicar uma moral.
A viagem pelas casas zodiacais encontra
expressão simbólica na ornamentação do templo maçônico: o teto reflete a imagem
do universo visível, firmamento onde as constelações que representam os signos
repousam expressos nas doze colunas que sustentam o mesmo.
Ao se falar de zodíaco é importante
minimamente descrever este conceito, o que se faz na tradução livre da obra Zodiac: a life epitome:
“O
Zodíaco, propriamente falando, é aquele cinturão nos céus através do qual passa
o aparente caminho do Sol; seu ponto inicial é o do Equinócio Vernal que, como
sabemos, está em movimento retrógado contínuo através de um círculo de
constelações que ficam perto da eclíptica. O Zodíaco está dividido em doze
porções iguais de 30 graus cada, quase que correspondendo às doze constelações
de Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão, Virgem, Libra, Escorpião, Sagitário,
Capricórnio, Aquário e Peixes. ”
(SAMPSON, 2003)
Para
melhor compreensão da trajetória anual do sol ao longo do caminho dos signos
zodiacais pode-se conceber a seguinte imagem:
É justamente esta marcha do Sul que é
representada simbolicamente nos doze trabalhos realizados por Héracles a fim de
expiar sua culpa pelo assassínio dos filhos (inclusive da esposa) e assim se
tornar um ser aperfeiçoado.
O sujeito se torna Héracles (espírito)
quando abandona seu vínculo à matéria (Alcides), ou seja, quando se afasta de
todos os vícios que lhe aprisionam a condutas mundanas e, por meio de uma
jornada iniciática interior (V.I.T.R.I.O.L.), busca sua evolução espiritual.
Para empreender tamanha jornada precisa:
a)
Adquirir
o entendimento de que toda a expressão material do Universo é simbólica e
transitória, inclusive seu próprio corpo;
b)
Aceitar
que a realidade de Deus é indiscutível, sendo uma verdade absoluta na consciência
de qualquer iniciado;
c)
Crer
que é um filho de Deus, criado à Sua imagem.
Somente ao se integrar a estas
conquistas decorrentes de sua viagem interior primeira o homem pode então
empreender a longa jornada dos doze trabalhos iniciáticos de Héracles. Não é,
pois, uma cerimônia de iniciação que torna o sujeito iniciado. O caminhante se
lapida caminhando.
Alcides
ruma a Delfos onde descobre sua longa jornada iniciática em direção a Héracles.
Aqui, propositadamente, a fim de se
discutir de maneira relacionada o desenvolvimento moral evocado pelo conjunto
dos trabalhos, optou-se por inicia-los em Áries, o roteiro mais comum dos
trabalhos.
3.
Os doze
trabalhos de Héracles (ou Hércules)
3.1 Primeiro
Trabalho: Áries, a captura das éguas devoradoras de homens.
a)
Sol
em Áries: de 21 de março até 20 de abril.
b)
Significado:
o aprendizado sobre o controle da mente.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“O PRIMEIRO Portal estava aberto de par
a par. Uma voz chegou através de Portal:
- “Hércules, meu filho, sai. Passa pelo
portal e entra no Caminho. Realiza teu trabalho e volta a mim, relatando o
fato”.
Com gritos de triunfo, Hércules se
lançou, correndo entre os pilares do Portal com arrogante confiança e segurança
de poder.
O filho de Marte, Diomedes, de ardente
fama, governava na terra além do Portal e ali criava os cavalos e as éguas de
guerra, nos pântanos de sua herdade. Os cavalos eram selvagens e as éguas
ferozes, e todos os homens tremiam ao ouvir seu tropel, pois eles assolavam por
todas as partes da terra, produzindo grande dano, matando a todos os filhos dos
homens que cruzassem seu caminho e engendrando constantemente cavalos mais
selvagens e malignos.
“Captura estas éguas e detém estes atos
malvados”, foi a ordem que se abateu nos ouvidos de Hércules. “Vai, liberta
esta terra longínqua e os que vivem nela”
“Abderis. ”, gritou Hércules,
“adianta-te e ajuda-me nessa tarefa”, chamando o amigo a quem amava
profundamente e que o seguia sempre em seus passos enquanto ia de um lugar para
o outro. Abderis se adiantou e tomou seu lugar ao lado do amigo e com ele
enfrentou a tarefa. Traçando todos os planos com cuidados, os dois seguiram os
cavalos enquanto percorriam as pradarias e os pântanos dessa terra. Finalmente,
Hércules conseguiu confinar as éguas selvagens dentro de um campo onde não
havia mais lugar para se moverem, e ali as prendeu e as manietou. Depois, deu
um grito de alegria pelo triunfo conseguido. Tão grande foi seu deleite na
proeza assim posto de manifesto que ele considerou por baixo de sua dignidade
pegar as éguas ou conduzi-las no caminho para Diomedes. Chamou o seu amigo,
dizendo: “Abderis, vem aqui e conduz estes cavalos através do portal”. Deu as
costas e marchou orgulhosamente para diante.
Porém Abderis
era débil e sentiu medo pela tarefa. Não pôde reter as éguas ou colocar nelas
os arreios ou conduzi-las através do Portal, atrás das pegadas de seu amigo. As
éguas se voltaram contra ele, desgarraram e o pisotearam, matando-o e depois
escapando para as terras mais selvagens de Diomedes.
Mais prudente,
desconsolado, humilde e desanimado, Hércules voltou a sua tarefa. Procurou de
novo às éguas de lugar em lugar, deixando o seu amigo agonizante sobre a terra.
Novamente prendeu os cavalos e os conduziu, ele mesmo, através do Portal. Porém
Abderis jazia morto.
O Mestre tudo
examinou com cuidado e enviou os cavalos a um lugar de repouso, para ali serem
domados e reduzidos à sua faina. O povo dessa terra, libertado do temor, deu as
boas-vindas a quem lhes havia libertado, aclamando Hércules como salvador da
Terra. Porém Abderis jazia morto.
O Mestre se
voltou para Hércules e disse:
- “O primeiro
trabalho está terminado; a tarefa está feita, porém malfeita. Aprende a
verdadeira lição desta tarefa e depois passa a outro serviço em favor de teu
próximo. Sai para a região do Segundo Portal. Encontra e faz entrar o touro
sagrado ao Lugar Sagrado”. ” (BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
Héracles inicia este primeiro trabalho
talvez ainda influenciado por todo tipo de vício moral que outrora lhe tornou o
descontrolado assassino de seus filhos. Arrogância, excesso de confiança e
segurança de poder dar conta do trabalho são as características psicológicas
marcantes ao início deste trabalho. A arrogância foi tamanha que, tendo logrado
êxito na missão, entendia que a condução das éguas capturadas seria atividade
abaixo de sua dignidade, motivo pelo qual a lega ao seu frágil amigo Abderis. O
resultado é a morte do amigo, que não tinha a mesma capacidade de Héracles. Um
incapaz mais uma vez morre pelo descontrole de Alcides. O trabalho precisou ser
refeito e finalmente as éguas foram conduzidas por Héracles através do Portal:
trabalho feito, mas mal feito.
É
justamente por denotar a necessidade do controle mental que os trabalhos de
Héracles se iniciam em Áries.
Ás éguas devoradoras de homens
simbolizam os pensamentos que inebriam a mente dos homens tomando-lhes o
controle dos atos e fazendo-os precipitados.
A tarefa do controle da mente é uma
atividade da alma (de Héracles) e não pode ser legada a qualquer outro incapaz
sob pena do insucesso: a morte de Abderis (aqui representando a personalidade)
pisoteado pelos “pensamentos”.
Há uma variante a este trabalho
denominado “As éguas de Diomedes” cujo
significado remete à perversidade humana:
“ Diomedes
era rei da Trácia. Possuía quatro éguas (Podarga, Lampona, Xanta e Dina), que
se alimentavam de carne humana. Eristeu encarregou Hércules de acabar com essa
prática selvagem e trazer as éguas para Argos.
Esse mito simboliza o fato de que na
vida humana há muita perversidade. Há homens que devoram outros para
satisfazerem seus instintos mais vis. Os perversos, quando vencidos, morrem por
si mesmos, destruídos pelos próprios inimigos que criou, ou por outras feras
iguais a eles. Mas nesse processo ocorre também a morte da beleza, da inocência
e da pureza simbolizadas pela rainha Alceste. O trabalho do iniciado é resgatar
desse tipo de “ morte” moral, as pessoas boas e puras que são vítimas dessa perversidade.
” (ANATALINO, 2010)
Figura 2: As
éguas de Diomedes
3.2
Segundo
Trabalho: Touro, a captura do touro de Creta.
a)
Sol
em Touro: de 21 de abril até 20 de maio.
b)
Significado:
o aprendizado sobre a natureza dos desejos.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ O
Grande Senhor falou ao Mestre do homem cuja luz brilhava entre os filhos dos
homens. Que também são filhos de Deus:
- “Onde está o homem que se manteve com
poder diante dos Deuses, recebeu dons e entrou pelo primeiro portal aberto de
par em par para trabalhar em sua tarefa? ”
- “Ele descansa, ó Grande Presidente e
reflete acerca de seu fracasso, lamentando-se por Abderis e busca ajuda dentro
de si mesmo”.
- “Muito bem. Os dons do fracasso
garantem o êxito quando são corretamente compreendidos. Que proceda a trabalhar
mais uma vez e penetre pelo Segundo Portal! ”.
Só e triste, consciente da necessidade e
consumido por uma profunda dor, Hércules passou lentamente entre os pilares do
Segundo Portal para a luz que brilhava onde estava o touro sagrado. No
horizonte se levantava a formosa ilha onde morava o touro e onde homens
arrojados podiam entrar no vasto labirinto que os atraía até o aturdimento, o
labirinto do Rei de Creta, o guardião do Touro.
Cruzando o oceano para a ensolarada
ilha, Hércules empreendeu sua tarefa de encontrar o touro e conduzi-lo ao Lugar
Sagrado onde moram os homens de um olho só (os grandes Iniciados que
desenvolveram a terceira visão) de um lugar ao outro, ele perseguiu o touro
sagrado dentro do labirinto, guiado pela fulgurante estrela que brilhava sobre
a fronte do touro. Sozinho, ele procurava o touro; sozinho ele o perseguia até
a sua guarida; sozinho ele o capturou e montou sobre seu lombo.
As suas voltas permaneciam as Sete
Irmãs, estimulando-o em seu caminho e, na luz resplandecente, ele o conduzia,
entregando-o depois aos 3 ciclopes. Estes três grandes filhos de Deus
aguardavam seu regresso, vigiando seu progresso através das ondas.
Ele conduziu o touro como se este fosse
um cavalo e com as 7 irmãs cantando, à medida que marchava.
Vem com força, disse Brontes; conduz na
luz, disse Steropes, tua luz interior será mais brilhante; vem rápido, disse
Arges, pois estás conduzindo através das ondas.
Hércules se aproximou empurrando o touro
sagrado e emitindo luz sobre o caminho que conduzia de Creta ao Templo do
Senhor.
Sobre a terra firme, a beira d’água,
estes três pararam Hércules e se apoderaram do touro.
- Que tens tu aqui? Disse Brontes,
detendo Hércules no caminho.
- O touro sagrado, ó Deus.
- Quem sois? Diga-nos teu nome, disse
Steropes.
- Eu Sou o filho de Hera, um filho de
homem e, contudo, um filho de Deus. Realizei minha tarefa.
- Leva agora o Touro ao Lugar Sagrado e
o salva, pois Minos desejava seu sacrifício. ” (BAILEY, 2008)
d)
Comentário
Sob o aspecto esotérico o touro é
relacionado às pulsões de vida e de morte bem como à energia sexual que é a
força motriz destas pulsões e da capacidade criativa. Da mesma forma que a
energia sexual é responsável pelo aprisionamento do sujeito em torno de
diversos vícios ela também serve de portal para acesso a níveis mais espiritualizados.
Alcançar tal evolução espiritual é algo que acontece por meio do domínio do
desejo, representado na alegoria do domínio do touro. Este touro que precisa ser salvo é a energia
sexual.
Sublimar a energia sexual é a tarefa
iniciática necessária para se direcionar ao Eu interior e ao mesmo tempo de
afastar do inimigo secreto (o ego e os vícios), representado por Minos na
alegoria.
“A luz na testa do Touro é a Estrela de
Aldebaran da constelação de Touro e as sete irmãs são as sete Plêiades que na
história representam os Arcanjos Guardiões dos Sete Portais, ou seja, os sete
centros de força do homem. ” (URBANO JR, 2012, p.448)
Pressupõe-se
que ao dominar o Touro o iniciado internaliza a Lei da Atração por sua integral
compreensão.
Pode-se
deduzir uma interpretação simbólica das advertências dos Titãs:
i)
“Vem
com força” significaria vem com a força
sexual necessária para a própria vida;
ii)
“Conduz
na luz” significaria que a energia sexual deve ser empregada aos mais elevados
propósitos;
iii)
“Vem
rápido, pois estás conduzindo através das ondas” significaria que o iniciado
não deve se deixar envolver em aspectos emocionais primitivos, como os desejos
sexuais desagregadores, em sua jornada iniciática.
Ilustração:
Figura 3:
Hércules dominando o Touro de Creta, estátua de August Kriessmann, Alemanha
3.3
Terceiro
Trabalho: Gêmeos, a colheita das maças (pomos) de ouro do jardim das
Hespérides.
a)
Sol
em Gêmeos: de 21 de maio até 20 de junho.
b)
Significado:
o conhecimento de si próprio.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ Hércules
pergunta ao seu Mestre: Diga-me o Caminho, Ó Mestre de minha Alma. Eu busco as
maçãs de Ouro (fruto da Árvore da Sabedoria). Eu as necessito rapidamente para
meu proveito. Mostra-me o caminho mais rápido e irei!
Resposta do
Mestre:
“Não é assim, meu filho. O Caminho é
longo. Só duas coisas te confiarei e, depois, a ti corresponderá comprovar a
verdade do que digo.
1ª. Lembra que a árvore sagrada está bem
custodiada. Três formosas donzelas apreciam a árvore, protegendo bem seu fruto.
Um Dragão de cem cabeças protege as donzelas e a árvore. Guarda-te bem da força
demasiado grande para ti, dos enganos demasiado sutis para tua compreensão.
Vigia bem.
2ª. A Segunda coisa que eu te diria é
que tua busca te levará onde te encontrarás com cinco grandes provas no
caminho. Cada uma te proporcionará o âmbito para a Sabedoria, a compreensão, a
destreza e a oportunidade. Vigia bem.
Temo, meu filho, que tu fracassarás em
reconhecer estes pontos sobre o Caminho. Porém, só o tempo o mostrará; Deus te acompanhe.
”
Confiante, porque pretendia o êxito e
não o fracasso, Hércules se pôs a caminho, seguro de si mesmo, de sua sabedoria
e de sua força.
Buscou primeiramente por toda a região
Norte do planeta, procurando a árvore sagrada. Perguntou a todos os homens que
encontrou, porém nenhum lhe soube responder. O tempo passou, embora ele
continuasse procurando de lugar em lugar e muitas vezes voltou sobre seus
próprios passos em sua denodada busca.
Embora triste e desanimado, continuou em
sua meta.
O Mestre, vigilante, de longe o
acompanhava e enviou Nereu para ver se podia ajudar. Este veio repetidas vezes
em forma variável e com diferentes palavras de verdade, porém Hércules não
respondia, nem sabia que o mensageiro era para ele. Não reconheceu a ajuda tão
sutilmente oferecida.
A primeira das cinco provas menores
tinha passado e o fracasso caracterizou esta etapa.
Enveredou então pelo Caminho do Sul, o
lugar da escuridão. À princípio sonhou com o êxito rápido, porém Anteo, a
serpente, o encontrou nesse caminho e lutou com ele, vencendo-o em todas as
ocasiões. “Ela custodia a árvore”, pensou Hércules; a árvore deve estar muito
perto dela.
Devo acabar com seu guardião e assim,
destruindo-o, abaterei a árvore e colherei seus frutos. Contudo, apesar de
lutar com muita força, ele não triunfava sobre Anteo.
- “Onde está minha falta? Por que Anteo
pode vencer-me, se ainda quando bebê eu destruí uma serpente em meu berço com
minhas próprias mãos. Por que fracasso agora? ”
Lutando com todo o seu poder, ele
agarrou a serpente com abas as mãos e elevou-a no alto, afastando-a do solo. A
luta estava terminada, pois Anteo perdeu suas forças, mas antes disse: Virei
outra vez com diferente aparência no oitavo portal. Prepara-te para lutar.
Feliz e confiante, Hércules continuou
seguro de si mesmo e se voltou para o Oeste, onde encontrou o desastre, pois
entrou, sem perceber, na 3a. grande prova, onde permaneceu longo tempo sem
avançar, pois, ali encontrou Busiris, o grande enganador, filho das águas e
parente próximo de Poseidon. Seu trabalho é conduzir os filhos dos homens ao
erro, através de palavras de aparente sabedoria, afirmando conhecer a verdade
e, com rapidez, os homens que procuram um mestre fora de si mesmos, acreditam
nele. Ele fala belas palavras dizendo: - “Eu sou o Mestre. A Mim
me foi dado o conhecimento da verdade e
deveis fazer sacrifícios por mim. Aceitem o caminho da vida através de mim.
Somente eu sei a verdade e ninguém mais. Minha verdade é justa. Qualquer outra razão é errada e falsa. Escutem minhas
palavras, permaneçam comigo e serão salvos”.
E Hércules obedeceu; diariamente seu
entusiasmo pelo caminho primitivo (a terceira Prova) debilitou-se e já não
procurava mais conquistar a árvore sagrada. Sua força se esgotou. Ele amou,
adorou a Busiris e aceitou tudo o que ele dizia. Sua debilidade crescia dia
após dia, até que chegou a época em que seu amado mestre o amarrou a um altar e
o manteve atado durante um ano.
Um dia, cansado e quando já estava
lutando para libertar-se, lentamente veio à sua mente palavras ditas por Nereu
havia muito tempo: A VERDADE ESTÁ EM TI MESMO. Em ti existe um poder, uma força
que jaz ali, o poder que é a herança de todos os filhos dos homens que são os
filhos de Deus. Neste instante, calmo, olhou para Busiris, por cuja causa
estava nesse transe e havia permanecido prisioneiro, atado aos quatro cantos do
altar, por um ano inteiro.
Então, com a força que é inerente a
todos os filhos de Deus, rompeu suas amarras, pegou o falso mestre (que havia
parecido ser tão sábio) e o atou ao mesmo altar no lugar que ocupara. Não disse
nada, porém o deixou ali para aprender a não enganar outros filhos do homem.
E seu Mestre Real percebeu o momento da
libertação e voltando-se para Nereu, disse: A 3a. Grande prova foi vencida. Tu
Nereu lhe ensinaste como encontrar a saída e, a seu devido tempo, ele soube
encontrá-la. Que siga adiante.
Instruído, e sem interrogações maiores,
Hércules continuou com sua busca e percorreu muitos caminhos. O ano que tinha
passado inclinado no Altar de Busiris lhe havia ensinado muito e, por isso
retornou com maior sabedoria à sua senda.
Repentinamente, deteve seus passos. Um
grito de profunda dor feriu seus ouvidos. Alguns abutres, dando voltas sobre
uma rocha distante chamou sua atenção; então ouviu novamente o grito. Devia
prosseguir seu caminho, ou buscar aquele que parecia estar em necessidade e
assim atrasar seus passos? Refletiu sobre o problema da demora: um ano havia
perdido e sentiu a necessidade de apressar-se. Outra vez ouviu um grito romper
o ar e Hércules, com passos rápidos, se apressou a ir à ajuda de seu irmão que
sofria. Foi quando se deparou com Prometeu acorrentado a uma rocha, sofrendo
dores terríveis causadas pelos abutres que bicavam seu fígado, matando-o pouco
a pouco.
Imediatamente Hércules rompeu a corrente
que o sujeitava e libertou-o afugentando os abutres para sua distante guarida e
depois, cuidou do enfermo até que se recuperasse totalmente das feridas. Então,
com muita perda de tempo, novamente começou a por-se no caminho. Neste
instante, sentiu dentro de si a voz de seu Mestre Real, que lhe disse: - “A 4a.
prova no caminho sagrado estava se realizando com aproveitamento. Não havia
ocorrido nenhum atraso. A regra que apressa todos os êxitos no caminho eleito,
é: APRENDE A SERVIR”.
E Hércules continuou sua busca da árvore
sagrada, agora se dirigindo para o Leste.
Um dia, já cansado de viajar, ouviu, de
um peregrino passante que, próximo a uma montanha distante, a árvore sagrada
seria encontrada. Imediatamente ele colocou seus pés no caminho e num dia
ensolarado, viu o objeto de sua busca.
Apressando seus passos, gritou em sua
alegria: - “Agora tocarei a Árvore Sagrada; vencerei o dragão que lhe custodia;
verei as formosas donzelas de grande fama e colherei as maçãs de ouro”.
Porém, novamente foi retido por um sentimento
de profunda compaixão. Atlas estava à sua frente, cambaleante sob a carga do
Mundo sobre seus ombros. Seu rosto estava marcado pelo sofrimento, seus membros
estavam curvados pela dor; seus olhos estavam cerrados pela agonia; ele não
pedia ajuda; também não viu a Hércules, mas permanecia encurvado pela dor, pelo
peso do mundo. Hércules, tremendo, observou e avaliou o peso da carga e da dor
de Atlas. Esqueceu sua busca. A Árvore Sagrada e as maçãs de ouro desapareceram
de sua mente e somente procurou ajudar o gigante, e isso sem pestanejar.
Lançou-se para adiante e ansiosamente tirou a carga dos ombros de seu irmão,
levantando-a sobre seus próprios ombros, tomando para si o castigo de sustentar
o mundo. Fechou seus olhos, firmando-se com esforço, e eis que a carga rodopiou
no espaço, onde permanece até hoje, deixando ele e também Atlas livre.
Diante dele estava parado o gigante
Atlas e em suas mãos estavam às maçãs de ouro, oferecendo-as, com amor, a
Hércules. A busca havia terminado.
As três irmãs sustentavam ainda mais
maçãs de ouro e o instavam também a recebê-las de suas mãos, e Eglé a formosa
donzela que é a gloria da vida e o esplendor do sol poente, lhe disse,
colocando uma maçã em sua mão: O caminho para nós é sempre marcado por atos de
amor.
Depois Eritheia, que cuida da porta que
todos devemos passar antes que elas se fechem sozinhas ante o Grande que
preside, deu-lhe uma maçã, e em suas costas, inscrita com luz, estava a palavra
dourada: Serviço.
Lembra isto, disse, não esqueça.
E, finalmente chegou a Hespérides
(Vontade), a maravilha da estrela vespertina, e lhe disse com clareza e amor:
Sê e serve, e percorre o caminho de todos os servidores do mundo daqui por
diante e para sempre.
- “Então restituo estas maçãs para
aqueles que seguem a mesma rota”, disse Hércules, regressando para onde tinha
começado sua luta.
Parou ante o Mestre e deu conta de tudo
o que havia acontecido. O Mestre lhe expressou sua alegria e, em seguida,
indicando com o dedo, assinalou o Quarto Portal e lhe disse: passe através
deste Portal e captura a corça com chifres de ouro e patas de bronze e penetra
uma vez mais no Lugar Sagrado. ” (BAILEY, 2008)
d)
Comentário
O signo de Gêmeos se refere ao
conhecimento (de si próprio) que é o ato de colher os pomos de ouro, os quais
são os frutos do conhecimento (do bem e do mal), arquétipo presente em diversas
culturas. A colheita e refere ao domínio que o iniciado realiza sobre seu corpo
físico e sobre o desejo através da razão.
As maças também se referem a um tipo
especial de conhecimento, a sabedoria, que só é obtida por meio do conhecimento
interno.
Nereu representa a inspiração divina que
ilumina o iniciado e Busiris os falsos mestres que se lhe apresentam ao
caminho.
A sabedoria só se conquista por meio do
serviço (ao próximo), o qual carece de compaixão e espírito de sacrifício
perante o outro.
O grande ensinamento da alegoria deste
trabalho é o de que a evolução espiritual não depende da luta contra o mal, mas
da aquisição de valores virtuosos por meio da lapidação interior.
e)
Ilustração:
Figura 4: Hercules Slaying The Dragon In The Garden Of
The Hesperides
3.4
Quarto Trabalho:
Câncer (Caranguejo), a captura da corça com chifres de ouro.
a)
Sol
em Câncer: de 21 de junho até 21 de julho
b)
Significado:
o desenvolvimento da intuição.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ Hércules,
depois de receber a tarefa de capturar a Corça com chifres de ouro está diante
do quarto Grande Portal. Não pronuncia nenhuma palavra nem nenhum som. Além
deste Portal se estende uma paisagem com contornos despojados e no horizonte
afastado se levantava o templo do Senhor, o santuário do Deus-Sol.
Sobre uma colina próxima estava parado
um belo espécime da família dos cervos e Hércules olhou e escutou e, escutando,
ouviu uma voz. A voz saía do brilhante círculo da Lua, que é o lar de Ártemis
filha de Zeus e Leto e irmã gêmea de Apolo. No panteão romano foi identificada
com Diana, a caçadora. E Ártemis, a fada, falou palavras de advertência ao
filho de Deus: - “A corça é minha, portanto, não a busques”, disse ela.
“Durante eras eu a alimentei e a cuidei quando jovem. A corça é minha e minha
deve permanecer”.
Então surgiu Diana, a caçadora dos céus,
a filha do sol. Saltando para a cerva, ela também reclamou a posse da mesma:
“Não é assim”, disse a formosa donzela; a corça é minha e minha deve
permanecer.
Hércules parado entre os pilares do
Portal escutou a querela entre as Deusas e muito se assombrou enquanto as duas
donzelas disputavam à posse da corça.
Outra voz assaltou seu ouvido e com
dominante acento disse: “A corça não pertence a nenhuma donzela, ó Hércules!
senão a Deus, cujo santuário tu vês no monte distante. Vai e resgata-a e depois
leva-a em segurança ao santuário e deixa-a ali. Uma tarefa simples de fazer, ó
filho de Deus! porém (e medita bem minhas palavras) sendo um filho de Deus, tu
podes, assim, buscar e pegar a corça. Vai.
Hércules saiu através do 4o. Portal
deixando atrás de si os muitos dons recebidos afim de que não estorvassem a
veloz perseguição que tinha por diante e, de certa distância, era observado
pelas donzelas discutidoras. Artemísia e Diana seguiam os movimentos da corça e
quando ela surgia para Hércules, cada uma delas enganava-o, buscando frustrar
seus esforços. Hércules perseguia-a de um ponto a outro e cada uma delas com sutileza
o enganava e, assim, procederam várias vezes.
Pelo espaço de um ano, Hércules
perseguiu a corça de lugar em lugar, vendo apenas ligeiros reflexos de sua
forma, tendo chegado a concluir, ao penetrar as regiões mais profundas do
bosque, que a tinha perdido. De colina em colina, de bosque em bosque, ele a
perseguiu até muito próximo de um tranquilo lago onde, de corpo inteiro, sobre
a relva não pisada, ele a viu dormindo, cansada de suas carreiras.
Com passo silencioso, mão estendida e
olho fixo, ele disparou uma flecha para a corça e a feriu em sua pata.
Estimulando toda a vontade da qual estava possuído, se aproximou mais e,
contudo, a corça não se moveu. Assim, se adiantou mais próximo e envolveu-a em
seus braços próximo de seu coração, sendo observado por Artemísia e Diana.
A busca havia terminado, cantou em voz
alta: - “A corça agora é minha! ”
“Isto não é verdade, ó Hércules! ”,
ouviu a voz de alguém que permanece próximo ao Grande Presidente dentro da
Câmara de Concílio do Senhor. A Corça não pertence ainda aos filhos de homens,
mesmo que seja um filho de Deus. Leva a corça a aquele Santuário, onde moram os
Deuses e deixa-a ali, com eles.
- “Por que deve ser assim, ó sábio
Mestre? A corça é minha; minha pela longa busca e a longa viagem que fiz e, por
confirmação, sustento-a perto de meu coração”.
-”E não é tu um filho de Deus, embora
também um homem”? E não é este santuário também tua morada? E não compartes tua
vida com todos os que moram aí dentro? – “Leva ao Santuário de Deus a corça
sagrada e deixa-a ali, ó Filho de Deus”.
E Hércules assim procedeu. ” (BAILEY,
2008)
d)
Comentário:
O signo de câncer é o signo da intuição
por ser introspectivo e ao mesmo tempo relacionado à descoberta da capacidade
interior da mente. A intuição transforma o intelecto justamente por não ser uma
faculdade que se desenvolve em termos lógicos: ela aparece e desaparece
subitamente e mesmo assim é de grande importância para a apreensão da
realidade.
Deixar para trás parte de si,
especialmente as crenças da mente, é condição necessária para se capturar a
corça (a intuição).
“Artêmis, a deusa lunar relacionada
astrologicamente com a imaginação instintiva, diz-se dona da corça.
Diana,
a deusa Caçadora, relacionada à ardilosidade mental, também se dizia dona da corça.
” (URBANO JR, 2012, p.456).
O problema que se coloca diante do
iniciado é justamente o de saber usar o instinto de maneira própria e no local
adequado.
Se em Áries se pode falar em uma mente
impulsiva, em Touro se fala da mente do desejo (controle dele), em Gêmeos da
mente intelectual e, por fim, de forma complementar, em Câncer da mente
intuitiva.
e)
Ilustração:
3.5
Quinto Trabalho:
Leão, matando o Leão de Nemeia ou trazendo o couro do Leão
a)
Sol
em Leão: de 22 de junho até 21 de agosto.
b)
Significado:
a partir dos aprendizados anteriores deve-se utilizar o poder e a coragem para
educar (submeter) a violência (interior).
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ O
Grande Presidente, dentro da Câmara do Concílio do Senhor (O EU SOU), observava
o repouso do guerreiro cansado e vigiava seus pensamentos. Dirigiu-se ao Mestre
que se mantinha ao seu lado, dentro da Câmara do Concílio do Senhor: - “O tempo
para um terrível trabalho está prestes a acontecer. Este homem, que é um filho
de homem e não obstante um filho de Deus, deve estar preparado. Que verifique
as armas que possui e que mantenha polido o seu escudo e que submerja suas
flechas numa mistura letal, pois horrível e espantoso é o trabalho que tem pela
frente. Que se prepare”.
Entretanto, Hércules descansava de seus
trabalhos e não tinha nenhuma informação sobre o que o esperava. De vez em
quando, lembrava gostosamente quando, além do Quarto Portal, persegue a Corça
Sagrada até o Templo do Senhor e esta, porque agora já o conhece bem, sempre
atende gentilmente aos seus chamados, permitindo que ele a coloque sobre o seu
coração.
Sendo requisitado novamente, Hércules se
colocou diante do Quinto Grande Portal, armado até os dentes com todos os instrumentos
de guerra a que tinha direito um verdadeiro guerreiro e enquanto ele se
mantinha ereto, os deuses vigilantes observavam seu passo firme, seu olhar
ansioso, sua mão pronta para a luta.
- “Que faço eu aqui? Perguntou ele.
“Qual a prova - e por que estou necessitado de passar este Portal? ”
Falando assim, ele escutava esperando
ouvir uma voz. – “Que faço eu aqui, Ó Mestre de minha vida, armado como Tu vês,
com toda a panóplia de guerra? Que faço eu aqui?”
- “Soou um chamado, Hércules, um clamor
de profunda dor. Teus ouvidos exteriores não responderam a esse chamado e, não
obstante, o ouvido interno conhece bem a necessidade, pois ele ouviu uma voz,
sim, muitas vozes, falando da necessidade, do apelo para que tu te arrisques
novamente.
O povo de Neméia pede ajuda para que
Hércules os livre de um leão que os apavora e angustia. A notícia de tuas
proezas se alardeou. Eles pedem que tu mates o leão que devasta sua região,
fazendo vítimas entre os homens.
- “E esse o ruído que ouço”? Perguntou
Hércules. É o rugido de um leão que escuto no ar vespertino?”
O Mestre disse: - “Vai, busca o leão que
assola a região situada na parte mais distante do Quinto Portal. O povo desta
assolada comarca vive silenciosamente detrás de suas portas com ferrolho; não
se aventuram sair para cumprir suas tarefas, nem cultivar suas terras, nem
semeiam. De norte a sul, do leste a oeste o leão saqueia e espreitando captura
a todo aquele que cruza seu caminho. Seu espantoso rugido é ouvido ao longo da
noite e todos estão tremendo detrás de suas portas trancadas. Que farás, Ó
Hércules? Que farás?”
Hércules, prestando atenção, respondeu à
necessidade.
No lado mais próximo do grande Portal
que custodia firme a região, ele deixou cair as armas de guerra retendo para
seu uso o garrote, cortado por suas mãos, de uma árvore jovem e primaveril.
- “Que estás fazendo, ó filho de homem,
que sois também um filho de Deus?”
- “Este admirável conjunto de armas só
me oprime, atrasa minha velocidade e obstrui minha marcha no caminho. Não
necessitarei nada senão minha robusta maça e, com esta clava e meu intrépido
coração, irei por meu caminho procurar o leão. Comunica ao povo de Neméia que
vou pelo Caminho e diga-lhes que abandonem seu temor”.
Durante longo tempo Hércules procurou o
Leão. Muitos dias e muitas noites se passaram com ele explorando o Caminho e
prestava ouvidos ao rugido do leão, enquanto o povo de Neméia se protegia atrás
das portas fechadas.
De repente viu o leão. Estava parado à
beira de um espesso matagal. Vendo o inimigo que se aproximava e que parecia
completamente sem temor, o leão rugiu, e com seu rugido os arbustos balançaram,
o povo de Neméia fugiu e Hércules permaneceu imóvel.
Empunhou seu arco e seu estojo de
flechas e, com mão segura e olho esperto, apontou uma flecha no lombo do leão.
A flecha resvalou e caiu sobre a terra, sem atravessar o lombo do leão. De novo
e repetidamente ele disparou suas flechas sobre o leão até que não restou uma
flecha em seu carcás. Então o leão partiu para ele intocado, ileso e
enfurecido, completamente sem temor. Arrojando seu arco sobre a terra, o filho
do homem, que é um filho de Deus, se lançou também com um grito selvagem para o
leão que estava na Senda, bloqueando seu caminho, espantado da proeza com a
qual até então não se havia encontrado. Hércules avançava.
Repentinamente, o leão se voltou e bateu
em retirada, fugindo pelo matagal e desapareceu. E assim continuaram os dois.
Repentinamente, enquanto corria pelo
Caminho, o leão desapareceu e não foi
visto nem se o ouviu mais.
Hércules se deteve no Caminho e
permaneceu silencioso. Ele procurava em todos os lados, empunhando seu firme
garrote. Por todos os lados ele buscava; passava por todos os caminhos, indo de
um ponto a outro sobre a longa Senda que corria contra os flancos da montanha.
De repente, se aproximou de uma cova e dali ecoou um forte rugido, uma voz
selvagem, surda e retumbante, que parecia dizer-lhe que se detivesse ou
perderia sua vida. Hércules permaneceu quieto, gritando para o povo da região:
- “o Leão está aqui. Aguardem minha façanha”. E Hércules que é um filho de
homem e, contudo um filho de Deus entrou na cova e percorreu toda a sua
extensão escura até a luz do dia e não encontrou o leão, somente outra abertura
na cova que conduzia à luz do dia. E enquanto permanecia em suspenso, ouviu o
leão atrás de si, não na frente.
- “Que farei?” disse. “Esta cova tem
duas aberturas e enquanto eu entro por uma o leão sai pela que eu deixei atrás.
Que farei? As armas não me servem. Como matar este leão e salvar o povo de seus
dentes. Que farei?”.
Enquanto procurava um meio para fazer
algo e escutava o rugido do leão, viu alguns montões de lenha e paus atirados
em grande profusão, ao alcance de sua mão. Tirando do monte o que necessitava,
arrastou-os com todas as suas forças e colocou um monte de paus e hastes com
pequenas ramas secas dentro da abertura que estava próxima e as amontoou ali,
bloqueando o caminho à luz do dia, para entrar e sair, fechando-se e encerrando
o feroz leão dentro da cova. Então se voltou e encontrou o leão.
Com suas mãos, pega o leão,
comprimindo-o com força, sufocando-o. Próximo de seu rosto sentia o aspirar e
respirar do leão. Porém, com decisão, manteve sua garganta apertada e o
estrangulou. Mais e mais débeis se tornaram os rugidos de ódio e temor; mais e
mais débil se tornava o inimigo do homem; cada vez mais baixo se abatia o leão,
porém Hércules o sustentava, asfixiando-o (tirando seu alento). E foi assim que
ele matou o leão com suas duas mãos, sem suas armas e com sua própria e
admirável força. Depois, retirou sua pele, mostrando-a para o povo que não
podia entrar na cova. – “O leão está morto”, gritavam, “o leão está morto”.
Agora podemos viver e lavrar nossas
terras e semear as sementes que necessitamos e andar em paz para sempre. O leão
está morto e grande é o nosso libertador, o filho de homem que é um filho de
Deus, chamado Hércules.
Assim Hércules retornou triunfante
Àquele que o enviou para provar sua força, para servir e satisfazer a
necessidade daqueles que se encontravam em horrível angústia. Ele colocou a
pele de leão sob os pés do que era o Mestre de sua vida e obteve permissão para
usar a pele no lugar da já gasta e usada.
- “A façanha está feita. O povo agora
está livre. Não existe mais medo. O leão está morto. Com minhas próprias mãos
eu estrangulei o leão e assim o matei.” - “De novo, ó Hércules, mataste um
leão. Outra vez o estrangulaste. O leão e as serpentes devem ser mortas
repetidas vezes. Bem fizeste, meu filho; vai e descansa em paz com aqueles que
hás libertado do temor”.
O quinto trabalho terminou e eu vou
relatá-lo ao Grande Presidente, que está esperando na Câmara do Concílio do
Senhor. “Descansa em paz”.
E da Câmara do Concílio chegou uma voz:
- “EU SOU”. “(BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
No seu quinto trabalho, o iniciado
realiza a quinta viagem iniciática e se torna a estrela de cinco pontas, o
homem perfeito que domina a si mesmo. Para tanto, o iniciado precisa antes
dominar seus instintos e demonstrar que tem poder sobre ela. O rugido do Leão é
o apelo sexual que precisa ser dominado. Não morto, mas controlado, sufocado.
“O
leão que estava na Senda, bloqueando a passagem é uma frase simbólica, que
deixa claro que, enquanto não dominar a libido, o homem estará impedido de
realizar seu progresso na Senda.” (URBANO JR, 2012, p.461)
O silêncio realizado por Hércules
durante o câmbio remete à meditação necessária quando se deseja vencer a si
mesmo, superando a libido em ação (os rugidos do leão). Enfrentar o Leão (a
besta interior) é etapa necessária ao iniciado que depois enfrentará a Hidra de
Lerna.
A imagem do Leão sufocado remete a cena
em que o iniciado, por meio da meditação, sufoca a libido (energia sexual
descontrolada) que o impede de ser libertar de si mesmo. Vestir a pele do Leão
tem relação com a morte dos instintos animais e domínio do campo emocional.
Toda a violência é abdicada quando
Hércules deixa para trás as armas e passa a se valer do intelecto (e da
meditação) para capturar seu inimigo, o Leão. Arma nenhuma consegue ultrapassar
o couro do Leão, da mesma forma que é difícil ao iniciado penetrar no íntimo
das energias sexuais. A cova é o sepultamento das pulsões sexuais por meio
dela, sem armas, Hércules conseguiu dominar a besta sufocando-a. É preciso
visitar as profundezas de si mesmo (cova) para se encontrar com o Leão (a besta
interior) e aí dominar ele.
Figura 6: Hércules sufocando o Leão
3.6
Sexto Trabalho:
Virgem, apoderando-se do cinturão de Hipólita
a)
Sol
em Virgem: de 22 de agosto até 21 de setembro.
b)
Significado:
a preparação do discípulo, a primeira iniciação e a capacidade de servir.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ O
Grande Presidente chamou o Mestre que vigiava Hércules.
- “A época se aproxima”, disse. “Como
está se conduzindo o filho de homem que é um filho de Deus? Está novamente
preparado para aventurar-se e provar sua têmpera com um adversário de uma
classe diferente? Pode passar agora o sexto Grande Portal?” O Mestre respondeu
– “Sim, ele está seguro de si mesmo; quando um novo mandato sair, ele voltará a
trabalhar novamente; isto posso afirmar ao Grande Presidente dentro da Câmara
do Concílio do Senhor”.
Então surgiu a ordem. – “Levanta-te, ó
Hércules e atravessa o sexto Grande Portal”. Outra ordem surgiu ao mesmo tempo,
não para Hércules, mas para aqueles que habitavam nas margens do grande mar.
Eles ouviram e escutaram.
Nessas margens habitava a Grande Rainha,
que reinava sobre todas as mulheres do mundo então conhecido. Estas eram suas
vassalas e, ao mesmo tempo, seus ousados guerreiros. Dentro de seu reino não se
encontrava nenhum homem.
Só as mulheres se reuniam em volta de
sua rainha. Professavam diariamente seu culto dentro do Templo da Lua e ali
elas faziam sacrifícios a Marte, o deus da guerra. Por esta época vinham de
regresso de sua visita anual a terra dos homens.
Dentro dos recintos do Templo elas
esperavam a ordem de Hipólita, a rainha, que estava parada sobre os degraus do
Altar Maior, levando o cinturão que Vênus, a rainha do amor, lhe dera. Esse
cinturão era um símbolo, um símbolo da unidade conquistada através da luta, do
conflito, da contenda; um símbolo da maternidade e da Criança Sagrada, para
quem toda vida humana realmente se volta.
- “Chegou a noticia”, disse ela, “que
por seu caminho vem um guerreiro cujo nome é Hércules, um filho de homem e, não
obstante, um filho de Deus; a ele devo entregar este cinturão que uso. –
“Obedecerei a ordem, ó Amazonas, ou combateremos a palavra de Deus?
Enquanto elas escutavam suas palavras e
enquanto refletiam acerca do problema, novamente surgiu uma voz, informando que
ele já estava presente, esperando sim apoderar-se do sagrado cinturão da
aguerrida rainha.
A Rainha das Amazonas se apresenta
diante de Hércules e este lhe dá combate sem escutar as belas palavras que esta
se esforçava por dizer. Ele arranca o cinturão oferecido em obséquio como
símbolo de unidade e amor, de sacrifício e de fé e mata Hipólita, que estava
disposta a lhe entregar prazerosamente o cinto.
Estarrecido e horrorizado do que havia
feito, Hércules permanecia ao lado da rainha agonizante, e ouviu uma voz dizer:
- “Meu filho, Por que matar o que
necessitamos, está próximo e é querido? Por que matar a quem amas, a doadora de
dignos presentes, custódia do possível? Por que matar a mãe do Menino Sagrado?
Outra vez te advertimos do fracasso. Outra vez não entendeste. Redime-te agora
mesmo e busca outra vez meu rosto”.
Fez-se silêncio e Hércules, levando o
cinturão sobre seu peito, buscou o caminho de volta, deixando às mulheres
lamentando-se, privadas de direção e de amor.
Hércules foi novamente para as costas do
grande mar e, próximo à costa rochosa viu um monstro do abismo sustentando
entre suas mandíbulas a pobre Hesíone. Seus gritos e lamentos se elevavam ao
alto e feriam os ouvidos de Hércules, entregue a compaixão e sem conhecer o
caminho que pisava.
Sem hesitar, ele se lançou prontamente
em sua ajuda, porém demasiado tarde.
Ela havia desaparecido dentro da
garganta cavernosa da serpente marinha.
Porém, esquecendo de si mesmo, Hércules
afastou resolutamente as ondas e alcançou o monstro, que voltando-se para ele
com rápido ataque e forte rugido, abriu sua imensa boca. Hércules se lança pela
mesma em busca de Hesíone, arrebata-a e enquanto a sustentava com a mão
esquerda, com a espada abria caminho desde o ventre da serpente até a luz do
dia. E assim a resgatou, compensando, desta forma, seu prévio ato de morte.
Pois assim é a vida: um ato de morte, um ato de vida e assim, os filhos dos
homens, que são filhos de Deus aprendem a sabedoria, o equilíbrio e a Senda
para caminhar com Deus.
Da Câmara do Concílio do Senhor, o
Grande Presidente era espectador de tudo. De seu posto ao seu lado, o Mestre
também contemplava.
Hércules retornou passando novamente o
Sexto Portal. Vendo isto e vendo o cinturão e a donzela (Hesione), o Mestre
disse:
- “O sexto trabalho está terminado.
Mataste a quem te estimava e todo o desconhecido e o não reconhecido que te
dava o necessário amor e poder. Resgataste a quem te necessitava, e assim de
novo os dois são um.
Reflete outra vez sobre os caminhos da
vida refletindo-se nos caminhos da morte. Vai e descansa, meu filho”. “
(BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
Este trabalho aponta para as três
virtudes principais no signo de Virgem, que são a tolerância, a compaixão e a
caridade. A falha de Hércules na tolerância (da diferença do outro ao matar Hipólita)
foi seguida da vitória dele na compaixão e na caridade (ao redimir-se salvando
Hesíone).
O guerreiro abriu mão da amizade da
guerreira Hipólita, e assim do seu lado feminino, o qual foi resgatado após o
aprendizado obtido com Hesíone. O cinturão representa justamente a energia
feminina, aquela que o iniciado deverá saber fazer bom uso.
A verdadeira tolerância não significaria
apenas um local de concordância ou simples aceitação da diferença do outro,
expressa por um comportamento condescendente de superioridade. A tolerância
significa antes o desejo de estar próximo do outro, da diferença do outro,
neste caso do aspecto feminino.
A tolerância se demonstra importante
virtude para equilibrar a dialética entre os interesses pessoais (levar o cinto
a Eristeu, ou sua filha) e os sociais
(aceitar a amizade de Hipólita), que se demonstra por meio do ato de servir.
e)
Ilustração:
3.7
Sétimo Trabalho:
Libra, captura do javali de Erimanto
a)
Sol
em Libra: de 22 de setembro até 21 de outubro.
b)
Significado:
Aquisição e integração do equilíbrio dos opostos. A segunda iniciação.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ (...)“Sai,
me filho, e captura o javali; salva uma região assolada, porém toma o tempo de
alimentar-te”.
Apolo vem e lhe oferece um arco
chamejante para usar. Diz Hércules: - “Não o levarei comigo no caminho por
temor de matar. Em meu último trabalho, nas margens do grande mar, eu matei e
destruí. Desta vez eu não matarei. Eu abdico do arco.
Desarmado, exceto por sua forte clava,
subiu a montanha, procurando o javali, vendo a cada lado, visões de medo e
terror. Subiu ainda mais e mais alto. Então se encontrou com um amigo, Folo, um
de um grupo de centauros, conhecido dos deuses. Eles se detiveram e conversaram
e, por um momento, Hércules esqueceu o objeto de sua busca. E Folo chamou a
Hércules, convidando-o a abrir um tonel de vinho, que não era seu, nem tampouco
pertencia a Folo. Este grande barril pertencia ao grupo de centauros; dos
deuses, que os haviam beneficiado com o tonel, havia vindo a ordem de que nunca
deveria ser aberto, salvo quando todos os centauros se encontrassem e
estivessem presentes. O tonel pertencia ao grupo.
Porém Hércules e Folo o abriram na
ausência de seus irmãos, chamando a Quíron, outro centauro sábio, para que
fosse e compartilhasse da bebedeira. Este assim o fez e os três beberam juntos
e se deleitaram e se embriagaram e fizeram muita farra. O alarido foi ouvido
pelos outros centauros onde se encontravam.
Eles acudiram encolerizados e uma feroz
batalha teve lugar e apesar das sábias resoluções, novamente o filho do homem
se transformou no mensageiro da morte e matou a seus amigos, os dois centauros
com os quais antes havia bebido. E enquanto os outros centauros se afligiam com
fortes lamentações, Hércules escapou outra vez para as altas montanhas e
novamente reassumiu sua busca.
Ele foi até os limites da neve, seguindo
as pegadas do feroz javali; seguiu-o até as alturas e o áspero frio e, contudo,
não o viu. A noite se aproximou e as estrelas começaram a sair e ainda não
tinha pista do javali.
Procurou dentro de si mesmo alguma
destreza ou malícia sutil. Colocou então, uma armadilha com habilidade e
sabiamente oculta e esperou numa sombra escura a chegada do javali. As horas
passaram e ele esperou até o alvorecer.
O javali saiu de sua guarida buscando
comida, impulsado por uma fome de dias. Nas sombras, próximo da armadilha,
Hércules o esperava. O javali caiu dentro da armadilha e em seu devido tempo
Hércules livrou-o, fazendo-o prisioneiro de sua habilidade. Lutou com o javali
e o dominou, obrigando-o a fazer o que ele dizia e seguir o caminho que
desejava.
Hércules desceu feliz do alto da
montanha, conduzindo diante de si, pela senda que baixava, o feroz, porém
domesticado, javali. Pelas patas traseiras, ele conduzia o javali e todos na
montanha riam ao ver a cena. Todos os que o encontravam no caminho, cantando e
bailando, riam também ao ver a marcha dos dois. E todos dentro da cidade riam
ao ver a mesma cena: o cambaleante e cansado javali e o homem que ria e
cantava.
Assim executou Hércules seu sétimo
trabalho e regressou para o Mestre de sua Vida.
E o Grande Presidente dentro da Câmara
do Concilio do Senhor observou: “A lição do verdadeiro equilíbrio foi
aprendida. Ainda falta uma lição.
De novo, no nono Portal, o centauro deve
ser encontrado e conhecido e retamente compreendido”.
E o Mestre disse: O sétimo trabalho está
completado, o sétimo Portal foi ultrapassado. Considera as lições do passado;
reflete sobre as provas meu filho.
Duas vezes mataste o que deverias amar.
Aprende o por quê.” (BAILEY, 2008
d)
Comentário:
O aprendizado deste trabalho recupera
aprendizados anteriores (especialmente aqueles utilizados na captura do Leão).
O correto uso do pensamento (e da meditação) facilita na realização das
tarefas, o que fica evidente pela captura do javali ter ocorrido sem emprego de
força física, o atributo mais conhecido de Hércules. A capacidade de lidar com
adversidades e inclusive improvisar é um dos aprendizados deste trabalho,
demonstrada quando Hércules desce a ladeira tomando o javali por suas patas
traseiras.Esta descida estranha da ladeira simboliza a alma dirigindo o corpo
rude, em equilíbrio para que nenhum dos dois tombe na íngreme caminhada que
sempre é a busca da verdade:“A Busca da verdade, então, transforma-se no
desenvolvimento do discernimento. Em um sentido, a verdade não existe para os
seres humanos, pois todas as verdades não são senão partes fracionárias de
conjuntos maiores.” (URBANO JR, 2012, p.468)
Neste
trabalho, uma segunda iniciação, Hércules abdica das armas que utilizou no
trabalho anterior e que o levaram assassinar sua tolerância e realiza sua
tarefa sem esforço físico ou violência, demonstrando ter assimilado o
aprendizado do equilíbrio ao conseguir capturar sem matar.
O
javali é o símbolo das emoções descontroladas e o uso da vontade é a ferramenta
para disciplinar tais emoções. O
equilíbrio evocado pela balança de Virgem aponta no sentido da busca do
equilíbrio interior entre os aspectos emocionais (animais) e os espirituais
(razão).
Figura 8:
Hércules e o Javali do Erimanto, estátua em bronze de Louis Tuaillon (1904),
Berlin.[8]
3.8
Oitavo Trabalho:
Escorpião, destruindo a Hidra de Lerna
a)
Sol
em Escorpião: de 23 de outubro até 22 de novembro.
b)
Significado:
Controle e superação dos desejos: a maior prova.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ ...)“A
Luz agora brilha no oitavo Portal”, disse o Mestre. - “No antigo reino de Argos
houve uma seca. Amimona suplicou a ajuda de Netuno e este lhe ordenou que
golpeasse uma roca e, quando ela o fez, brotaram três correntes cristalinas;
porém prontamente uma hidra fez ali sua morada. Ao lado do Rio Amimona, está o
infecto pântano de Lerna. Dentro desta fétida lama jaz a monstruosa hidra, uma
calamidade para a comarca. Esta criatura tem nove cabeças e uma delas é
imortal. Prepara-te para combater com esta repugnante besta. Não penses que
podem servir-te meios comuns; destrói uma cabeça, duas crescem aceleradamente.”
Hércules aguardava com expectação.
O Mestre voltou a falar: - “Eu só posso
dar uma palavra de conselho:
“Ascendemos ajoelhando-nos; vencemos
cedendo, ganhamos renunciando. Vai ó filho de Deus e filho de homem e vence!”.
Então Hércules ultrapassou o oitavo Portal.
As águas estancadas do pântano de Lerna
era uma mancha que desalentava a todos que chegavam a seus confins. Seu mau
cheiro contaminava toda a atmosfera num espaço de 10 quilômetros. Quando
Hércules se aproximou teve que deter-se, pois só o mau cheiro quase o venceu. A
lodosa areia movediça era um perigo e mais de uma vez rapidamente retirou seu
pé, temendo que fosse sugado pela terra frouxa.
Finalmente encontrou a toca onde morava
a monstruosa besta.
Dentro de uma caverna onde reinava
perpétua noite, a hidra estava oculta. De dia e de noite Hércules rondava o
traiçoeiro pântano, esperando o momento propício em que a besta saísse. Ele
vigiava em vão. O monstro permanecia dentro de seu fétido lamaçal.
Recorrendo a um estratagema, Hércules
submergiu suas flechas em breu ardente e as fez chover diretamente dentro da
horrível caverna onde morava a bocejante besta. Uma agitação e comoção
imediatamente sobrevieram.
A hidra emergiu com suas nove
encolerizadas cabeças exalando chamas. Sua escamosa cola açoitava furiosamente
a água e a lama salpicou a Hércules. O monstro levantou-se a altura de três
braças (6,6m); sua fealdade permitia que se pensasse que foi feito com todos os
mais impuros pensamentos concebidos desde que começou o tempo. A hidra se
lançou sobre Hércules e procurou enrolar-se ao redor de seus pés. Ele se
afastou e lhe assestou um golpe tão demolidor que uma de suas cabeças foi
imediatamente separada. Apenas havia esta horrível cabeça caído dentro do
pântano, duas cresceram em seu lugar. Uma e outra vez Hércules atacou o furioso
monstro, porém este a cada assalto se tornava mais forte.
Então Hércules se lembrou que seu Mestre
havia dito: “nos elevamos ajoelhando-nos”. Jogando para um lado seu garrote,
Hércules se ajoelhou, agarrou a hidra com suas mãos desnudas e levantou-a no
ar. Suspensa no meio do ar, sua força diminuiu. De joelhos, então, ele
sustentou a hidra, no alto, por cima dele, para que o ar e a luz purificadora
pudessem ter seu esperado efeito. O monstro forte na escuridão e no pantanoso
barro, rapidamente perdeu seu poder quando os raios do sol e o contato do vento
caíram sobre ele.
Esforçou-se convulsivamente, passando um
estremecimento através de sua repugnante figura. Cada vez mais desfalecida se
fez sua luta até que foi vencida. As nove cabeças se inclinaram. Logo arquejantes
bocas e olhos vidrados caíram frouxamente para diante. Porém só quando elas
jazeram totalmente sem vida Hércules percebeu a mística cabeça imortal.
Então Hércules cortou a cabeça imortal
da hidra e, embora esta estivesse ainda silvando ferozmente, a enterrou debaixo
de uma rocha.
Retornando, Hércules parou diante de seu
Mestre. “A vitória foi conquistada” disse o Mestre. “A luz que brilha no oitavo
Portal está agora misturada com tua própria luz”. “ (BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
A bela alegoria das cabeças que surgem
sempre que uma é cortada remete à gênese dos pensamentos e desejos: quando o
iniciado se livra de um, outros aparecem. Neste sentido, o iniciado precisa ter
extrema paciência para inventariar os pensamentos e desejos que surgem a todo
momento (inclusive os que se colocam mais ocultos) a fim de, ao polir sua
personalidade, manter os mais elevados.
Está luta contra os pensamentos e
emoções que se multiplicam só prosperará quando o iniciado se elevar aos
pensamentos mais superiores. Da mesma forma que Hércules precisou sair do
lamaçal e elevar a Hidra para combate-la, o iniciado precisa primeiro se
preocupar em elevar seus pensamentos para então vencer o aspecto mais viciado
de sua personalidade. Superar a si mesmo passa
não necessariamente por matar os pensamentos ruins, mas se elevar em
direção aos bons.
Da mesma forma que a uma das cabeças da
Hidra mitológica era imortal, há uma série de pensamentos e emoções que
simplesmente não podem ser extirpadas pois são constitutivas do indivíduo e responsáveis
pelo caminho que levou o iniciado até o momento atual. Mais um motivo para se
crer que a libertação passa mais pelo controle do que pelo extermínio dos
vícios.
Tal exercício de controle passa
invariavelmente pela necessidade do homem se colocar humilde diante da força
que os vícios tem em sua vida, da mesma forma que Hércules fez ao se ajoelhar
na lama.
Simbolicamente, segundo Urbano Jr.
(2012, p. 473-474) pode-se deduzir a dimensão simbólica das cabeças da Hidra:
“(...) 7. Três das cabeças da hidra
estão associadas com: Desejo (Sexo), Comodidade e Dinheiro.
8. O segundo grupo de três correspondem
ao Temor, Ódio e o Desejo de Poder.
9. As três últimas correspondem aos
vícios da mente não iluminada, ou seja: Orgulho, Separatividade e Crueldade.
10. As três virtudes que Hércules tinha
de expressar eram: humildade, coragem e discernimento. Humildade para
reconhecer seus defeitos e o problema a ser enfrentado: coragem para atacar o
monstro que permanece enroscado nas raízes de sua natureza e discernimento para
descobrir a técnica para possuí-las no encontro com seu mortal inimigo. ”
(URBANO JR, 2012, p.473-474)
Assim, pode-se deduzir que as cabeças
simbolizavam os nove vícios capitais e, tal qual afirmava Sócrates, o exercício
da virtude é a eterna vigilância do vício.
Figura 9: Hércules e a Hidra de Lerna
3.9
Nono Trabalho:
Sagitário, afugentando as aves de Estínfale (ou a morte das aves)
a)
Sol
em Sagitário: de 23 de novembro até 22 de dezembro.
b)
Significado:
Acabar com as tendências do uso do pensamento destrutivo.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ Dentro
do lugar de paz permanecia o Mestre e falou para Hércules: - “Ó filho de Deus
que sois também um filho de homem. Chegou a hora de pisar outro caminho.
Achas-te diante do nono Portal. Passa por ele e dirige-te ao pântano de
Estínfale, onde moram os pássaros que fazem estragos. Descobre depois o meio
para fazê-los voar de sua segura morada por muito tempo. “A Chama que brilha
além da mente revela a direção segura”, acrescentou. A tarefa aguarda. Deves
passar agora através do nono Portal.”
Hércules procurou durante muito tempo
até que chegou a Estínfale.
Ante ele se estendia fétido pântano. Uma
multidão de pássaros grasnavam roucamente, de forma ameaçadora e dissonante à
medida que ele se aproximava.
Olhando de mais perto viu os pássaros.
Eram grandes, ferozes e horríveis. Tinham bicos de ferro, afiados como uma
espada. As penas também, como dardos de aço, se caíssem, podiam partir em dois
a cabeça dos fatigados viajantes. Suas garras se igualavam a seus bicos em
agudeza e força.
Três pássaros, percebendo a presença de
Hércules, se precipitaram sobre ele. Ele, entretanto, manteve-se em seu lugar e
aparou os ataques com a pesada clava que sustentava. Golpeou as costas de um dos
pássaros de forma ressoante e duas penas caíram verticalmente ao solo e
tremularam enquanto afundavam na terra frouxa. Finalmente os pássaros se
retiraram. Hércules permanecia diante do pântano e refletia em como poderia
realizar a tarefa que lhe foi deferida, ou seja, como livrar o lugar destas
aves de rapina. Procurou muitos meios para encontrar uma maneira de
consegui-lo. No princípio tentou matá-las com seu arco e o carcás cheio de
flechas. As poucas que matou não eram senão uma fração das muitas que ficavam.
Elevavam-se em nuvens tão espessas que ocultavam o sol.
Pensou em colocar armadilhas dentro do
pântano, porém nem barca nem pés humanos podiam atravessar o lamaçal.
Hércules meditou e lembrou então das
palavras de conselho que seu Mestre lhe havia dado. Refletindo por um longo
tempo se lhe ocorreu um método, pois lembrou que tinha dois grandes címbalos de
bronze, presentes da Deusa Atenéia, que emitiam um agudo sobrenatural; um som
tão penetrante e tão desagradável que podia assustar os mortos. Para o próprio
Hércules o som era intolerável que teve de tampar os ouvidos com duas
almofadas, tal o desconforto que sentiu.
Na hora do crepúsculo, quando o pântano
estava repleto de inumeráveis pássaros, Hércules golpeou os pratos dos címbalos
com vigor várias vezes e um estrondo estridente sobreveio que até ele mesmo
apenas podia suportá-lo. Tal dissonância jamais tinha sido ouvida em Estínfale.
Aturdidas e perturbadas por tão
monstruoso ruído, as aves se elevaram no ar com as asas de bronze batendo
selvagemente e chilrando com ronco desalentado. Completamente perturbada, a
vasta nuvem de pássaros fugiu com pressa frenética, para nunca mais regressar.
O silêncio se difundiu através do pântano. As aves horríveis tinham
desaparecido.
Quando Hércules regressou, o Mestre lhe
saudou: As aves de rapina foram afugentadas. O trabalho está cumprido.
“(BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
Se em Áries Hércules não zela pelo
trabalho ao permitir que seu amigo conduza as éguas, irresponsabilidade que
matou Abderis, em Sagitário Hércules assume integralmente o trabalho,
utilizando-se de todos os aprendizados anteriores, deste a observação, a
criatividade, a vontade e, por fim, a intuição.
As três aves que lhe atacam representam
alegoricamente, segundo Urbano Jr (2012, p.475) a “murmuração, (a reclamação de
não ser compreendido pelos outros), conversação deletéria (ou seja, o cuidado
com a palavra proferida) e intolerância em relação às verdades alheias, ou
seja, a prática da minha opinião é que
deve prevalecer.”
As aves representam os pensamentos
equivocados que perturbam a caminhada do iniciado na senda evolutiva. É preciso “afugentar” tais pensamentos do
lamaçal que são os vícios da personalidade.
Uma versão alternativa da mesma história
fala que as aves que possuíam bicos, penas e garras de bronze (metal inferior)
foram afugentadas quando Hércules sacodiu os chocalhos de ouro (metal superior,
no sentido alquímico) que recebera de Hermes.
O som que vem do ouro é o aviso da
sabedoria, do pensamento intuitivo, enfim, dos pensamentos superiores que tem a
capacidade de “afugentarem” todo tipo de pensamentos inferiores (as aves com
partes em bronze). Escutar o som áureo é escutar o interior do ser.
A capacidade intuitiva evocada em
Sagitário também mantém relação com o pensamento abstrato, tão importante para
o estudo iniciativo às crenças filosóficas e religiosas. As aves gigantes que
ofuscavam o sol são as crenças dogmáticas que precisam ser afugentadas para que
a verdadeira luz da sabedoria possa iluminar o iniciado acabando com as tendências
do uso do pensamento destrutivo.
Figura 10:
Hércules e as aves, tapeçaria do século XVI
3.10
Décimo Trabalho:
Capricórnio, matando o Cérbero
a)
Sol
em Capricórnio: de 23 de dezembro até 20 de janeiro.
b)
Significado:
Elevação da personalidade. A terceira iniciação.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ (...)“Mil
perigos desafiastes, ó Hércules e muito conquistastes. A força e a Sabedoria
são tuas. Farás uso delas para resgatar o que agora é vítima de uma enorme
injustiça e persistente sofrimento?”
O mestre toca suavemente a fronte de
Hércules. Ante o olho interior, deste, surgiu a visão de um homem encerrado em
lugar infecto e assolado por milhares de criaturas demoníacas. Alçava suas mãos
contritas e gritava pedindo ajuda, porém suas palavras retumbavam vãmente na
desolação e eram tragadas pelo vento. A visão desapareceu. Hércules permanecia
como antes ao lado de seu guia.
O prisioneiro que viste se chama Teseu,
disse o Mestre. Por anos tem sofrido assim por ter tentado, com a ajuda de seu
amigo Piritoo (O Cristo), arrebatar Perséfone (a Alma), a companheira de Hades,
o Senhor das profundezas. Descoberto, permanece manietado sob grandes
sofrimentos.
Havendo ouvido e compreendido, Hércules
se lançou nesta busca e passou através do décimo Portal.
Para baixo, sempre para baixo, ele
viajou dentro dos apertados mundos da forma. A atmosfera se havia tornado
sufocante e fétida; a escuridão cada vez mais intensa e, contudo, sua vontade
era firme. A inclinada descida continuou durante muito tempo, somente que a
partir de certo tempo começou a sentir outras presenças ao seu lado e,
procurando, ouviu a voz prateada da deusa da Sabedoria Atenéia e as palavras
fortalecedoras de Hermes-Mercúrio.
Finalmente chegou a esse escuro e
envenenado rio chamado Estige, o rio que deve ser cruzado pelas almas dos
mortos. Um óbolo ou moeda precisava ser pago a Caronte, o barqueiro, para que
conduza as Almas, à outra margem, ou seja, para a terra sem volta. O sombrio
visitante da Terra assustou a Caronte que, esquecendo sua paga, conduziu o
estrangeiro ao outro lado.
Hércules entrou por fim no Hades, uma
escura e brumosa região onde as sombras dos mortos deslizavam por ali.
Através de negros labirintos fez seu
caminho até que chegou a sala do rei que governava o mundo subterrâneo: Hades.
Este, soturno e severo, com semblante ameaçador, estava sentado em seu negro
trono de azeviche, enquanto Hércules se aproximava.
Que buscas tu, um mortal vivente em meus
domínios? Perguntou Hades. Hércules respondeu: “Busco libertar Teseu”.
- O caminho está vigiado pelo monstro
Cérbero, um cachorro com três grandes cabeças, cada uma das quais tem serpentes
enroscadas ao seu redor, replicou Hades. Se tu podes vencê-lo com tuas mãos
desnudas, uma façanha que ninguém ainda realizou, podes levar Teseu. Satisfeito
com esta resposta, Hércules prosseguiu. Imediatamente viu o cão de três cabeças
e ouviu seu penetrante latido. Grunhindo, este saltou sobre Hércules.
Agarrando primeiro a garganta de
Cérbero, Hércules a apertou com seu punho de aço, como num torno. Atingido até
a fúria frenética, o monstro se sacudiu. Finalmente, ao apaziguar-se sua força,
Hércules o dominou.
Feito isto, Hércules prosseguiu e
encontrou Teseu em agonizante dor. Então, Hércules rompeu rapidamente suas
cadeias e libertou o prisioneiro.
Apressando seus passos, Hércules
regressou como havia vindo. Quando alcançou mais uma vez o mundo das formas
viventes, encontrou ali a seu Mestre.
“A luz agora brilha dentro da escuridão”
disse o Mestre. Descansa agora meu filho.
“(BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
Por mais que a história não detalhe,
fica claro que antes de iniciar o trabalho em Capricórnio, Hércules passou pelo
processo de purificação a fim de provar que havia vencido o seu próprio ímpeto.
As três cabeças do cão simbolizam,
segundo Urbano Jr (2012, p.478) “a sensação, o desejo e as boas intenções”.
A avalanche de sensações do mundo pode
ocupar a mente e a capacidade de discernimento daqueles que, mesmo iniciados,
vivem adormecidos de si mesmos. A sensação, segundo Urbano Jr. (2012, p.478) é
a “vontade que deseja se expressar e, assim obter satisfação no mundo
exterior”. É preciso vigiar as
sensações.
A principal “cabeça” é a do desejo, que
é a força motriz de todas as demais cabeças, de todas as vontades. Impossível é
vigiar o desejo, mas importante é observa-lo e conhece-lo.
O desejo, diante de um mundo repleto de
sensações, pode caminhar ao lado da terceira cabeça (a das boas
intenções). A terceira cabeça aí
simboliza um tipo especial de boa intenção: aquela que não é levada a termo.
Esta intencionalidade vazia, ainda que boa, não possui efeito prático na senda
evolutiva do iniciado. Por isso, merece a atenção para que não ocupe o caminhar
daquele.
As serpentes na cauda se referem às
ilusões do mundo material, que aprisionam o homem em uma série de atividades
que sugam a energia psíquica do iniciado e o afastam de pensamentos mais
elevados.
A libertação de Teseu simboliza a terceira
iniciação de Hércules, agora voltado por fazer feliz a humanidade e colocado em
posição de servir ao outro. Teseu é a inteligência humana, liberta por Hércules
de tudo que simboliza o cão Cérbero.
Para libertar Teseu, Hércules precisa visitar os mundos inferiores onde
a inteligência humana está aprisionada.
Ao finalizar sua missão de libertação,
Hércules ouve de seu mestre que “a luz
agora brilha na escuridão”. Pela terceira iniciação Hércules não apenas
recebeu a luz (simbolizada pelo aprendizado em todos os demais trabalhos
anteriores) mas também se torna um verdadeiro portador da luz, levando-a aos
mundos inferiores a fim de liberar a inteligência humana. Hércules está elevado.
Uma variante da mesma história concebe
que Cérbero (nome que significa demônio do poço) era sinônimo da própria morte
por guarnecer o caminho ao Hades (inferno). Capturar ou transpor Cérbero seria
superar a morte. Quem passava pelo cão jamais voltava. As três cabeças
serviriam para julgar aquele que entrava no mundo dos mortos: uma para julgar
sua beleza, outra sua nobreza e a terceira a sua bondade. Cérbero admirado por
encontrar em Hércules as três graças tornou-se frágil de modo que o herói o
captura e leva ao rei Eristeu. Este mesmo Cérbero, segundo tal variante, ao
cruzar-se com uma Quimera, foi o pai do Leão de Nemeia e ainda da Esfinge
derrotada por Édipo.
Figura 11:
Hércules e o cão de três cabeças Cérbero
3.11
Décimo Primeiro
Trabalho: Aquário, limpando os estábulos de Áugias
a)
Sol
em Aquário: de 21 de janeiro até 19 de fevereiro.
b)
Significado:
O serviço de limpeza e purificação, com uso da água, preparando o encerramento
do ciclo.
c)
História,
segundo Bailey (2008):
“ O
Mestre para Hércules:
“Onze vezes girou a roda e agora tu
estás diante de outro Portal.
Volta sobre teus passos; regressa para
aqueles para quem a luz não é senão um ponto transitório e, ajuda-os a fazê-la
crescer. Dirige teus passos para Augias, cujo reino deve ser purificado de
antigos males.”
Saiu Hércules pelo décimo primeiro
portal em busca do Rei Augias.
Quando Hércules se aproximou do reino
onde Augias era o soberano, sentiu um horrível mau cheiro que o debilitou e
quase o fez desfalecer. Tomou conhecimento de que, por anos, o Rei Augias não
havia tirado nunca o esterco que seu gado deixava dentro dos estábulos reais.
Também as pradarias estavam cheias de
esterco, impedindo que nenhuma semeadura pudesse crescer. Em consequência, uma
abrasante pestilência estava percorrendo toda a região, fazendo estragos junto
aos súditos do reino.
Hércules então dirigiu-se ao palácio e
procurou Augias. Informado de que Hércules limparia os hediondos estábulos,
Augias demonstrou desconfiança e incredulidade.
Dizes que farás este enorme labor sem
recompensa? Manifestou suspicazmente o rei. “Não tenho fé naqueles que fazem
tais alardes. Algum arteiro plano hás tramado, Ó Hércules, para despojar-me do
trono. Nunca ouvi nada de homens que buscam servir ao mundo sem uma recompensa.
Neste momento, contudo, daria as boas-vindas a qualquer néscio que buscasse
ajudar. Porém devemos fechar um trato, a fim de que não seja repreendido como
um rei tonto. Se tu, em um só dia, fizeres o que prometes, uma décima parte de
meu grande rebanho será teu; porém se fracassas, tu vida e sorte estarão em
minhas mãos. Naturalmente eu não penso que tu possas cumprir tua bravata,
porém, procura fazê-lo como possas.”
Hércules saiu da presença do Rei. Andou
pelo assolado lugar e viu uma carreta carregada com cadáveres apinhados,
vítimas da pestilência.
Observou que dois rios, o Alfeu e o
Peneo corriam tranquilamente próximo dali. Sentado nas barrancas de um deles, a
resposta de seu problema surgiu relampagueante em sua mente.
Foi para as estrebarias e primeiro
destruiu o muro que rodeava os estábulos; depois fez dois grandes buracos em
seus lados opostos e, com grandes esforços conseguiu desviar ambas correntes do
curso que haviam seguido durante décadas. O Alfeu e o Peneo verteram suas águas
através dos estábulos do Rei Augias, cheios de esterco. As impetuosas correntes
varreram a imundícia acumulada durante 30 anos. O reino foi purificado de toda
a sua fétida escuridão. Num único dia, Hércules havia realizado a tarefa
impossível e, completamente satisfeito com este resultado, regressou para onde
estava Augias. Este, ao vê-lo, franziu o cenho. “Tu tiveste êxito por meio de
um ardil”, gritou o Rei, cheio de ira. “Os rios fizeram o trabalho, não tu. Foi
uma artimanha para apoderar-te de meu gado; uma conspiração contra meu trono.
Não terás recompensas. Vai-te, retira-te daqui antes que rebaixe tua estatura
numa cabeça.
Assim, o encolerizado rei desterrou
Hércules, e lhe disse que nunca mais pusesse os pés em seu reino sob pena de
uma morte súbita.
Tendo realizado a tarefa que lhe foi
assinalada, Hércules voltou àquele de quem havia vindo.
“Te tornaste um servidor do mundo”,
disse o Mestre quando Hércules se aproximou. “Progrediste retrocedendo;
chegaste a Casa da Luz por outro caminho; tu empregaste tua luz para que possa
brilhar a luz dos outros. A joia que outorga o undécimo trabalho é tua para
sempre”. “ (BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
A Era de Aquário é marcada por um
“derrubar de muros”, justamente o que Hércules fez ao derrubar as barreiras que
envolviam os estábulos. Esta tendência “libertária” da Era de Aquário é
expressa nas relações sociais, políticas e econômicas na atualidade.
Se ao libertar Teseu pode-se afirmar que
Hércules se colocava como herói-salvador de um homem, ou de uma característica
humana (a inteligência), agora ao limpar as estrebarias ele se coloca como
“Mestre Servidor da espécie raça”, nas palavras de Urbano Jr (2012, p.480).
Hércules se purifica ao purificar o
mundo, direcionando o fluxo de limpeza e purificação de suas energias sexuais.
Hércules, purificado em Aquário é Mestre porque aprendeu a servir e aprendeu a
servir porque se tornou Mestre. Neste
sentido, contribuir Urbano Jr (2012, p.481):
“Serviço desinteressado – Este não é o
serviço que prestamos porque alguém nos diz que o serviço prestado é um caminho
para nossa libertação espiritual, mas o serviço que prestamos porque nossa
consciência não é mais autojcentrada e temos a convicção de que precisamos
ajudar nossos semelhantes. Não estamos mais interessados em nós mesmos, já que
nossa consciência tornando-se universal começa a assimilar as aflições de nosso
próximo e então passamos a ajudá-lo porque passamos a ter a consciência de que
ele faz parte de nós. Não é nenhum esforço para o Mestre Aquariano proceder
assim.” (URBANO JR, 2012, p.481)
Ao descer do alto da montanha em
Capricórnio para limpar os estábulos Hércules demonstra o auto sacrifício
necessário para a purificação interior.
Importante mencionar que na Grécia
antiga era hábito os gregos tomarem três banhos diários, pois a cultura
acreditava que a água era purificadora não apenas do corpo, mas do espírito.
Limpar os estábulos é uma alegoria à purificação de si mesmo.
O iniciado em Aquário tem o compromisso
altruísta de concorrer à salvação da humanidade, influenciando-a positivamente
com suas atitudes purificadoras.
Este trabalho de Hércules simboliza a
capacidade de se transcender os interesses pessoais e trabalhar em prol do bem comum,
seguindo o grande plano universal da vida (a senda iniciática).
Figura
12: Os Estábulos do Rei Áugias
3.12
Décimo Segundo
Trabalho: Peixes, a captura da manada colorida de Gerion ou a captura do gado
vermelho de Gerião
f)
Sol
em Peixes: de 20 de fevereiro até 21 de março.
g)
Significado:
A transcendência da animalidade, a salvação.
h)
História,
segundo Bailey (2008):
“ O
Mestre, para Hércules:
“Estás agora diante do último portal.
Resta fazer ainda um trabalho antes que o círculo se complete e seja alcançada
a libertação. Marcha para esse tenebroso lugar chamado Eritréia, onde a Grande
Ilusão está entronizada; onde Gerion (o Inimigo Secreto), o monstro de três
cabeças, três corpos e seis mãos, é o Senhor e Rei. Ilegalmente ele retém uma
manada de Bois vermelhos. Desde Eritréia até nossa Cidade Sagrada tu deves
conduzir esta manada. Cuidado com Eurition, o pastor e seu cachorro de duas
cabeças, Ortro”. Fez uma pausa. “Posso fazer-te uma advertência”, agregou
lentamente. “Invoca a ajuda de Hélios”.
O filho de homem que era também filho de
Deus partiu através do duodécimo portal. Ele ia à busca de Gerion.
Dentro de um templo, Hércules fez
oferendas a Hélios, o deus do fogo no Sol. Meditou durante sete dias e então
lhe foi concedido um favor. Um cálice de ouro caiu ao solo ante seus pés. Ele
soube dentro de si mesmo que este brilhante objeto lhe permitiria cruzar os
mares para chegar à região da Eritréia.
E assim foi. Dentro da segura proteção
do cálice de ouro, ele navegou através de agitados mares até que chegou a
Eritréia. Hércules desembarcou numa praia do longínquo país. Não muito depois
chegou à pradaria onde a vermelha manada pastava. Esta estava cuidada pelo
pastor Eurition e por Ortro, o cachorro de duas cabeças.
Quando Hércules se aproximou, o cachorro
veio veloz como uma flecha para seu alvo. O animal se lançou sobre o visitante,
grunhindo malignamente, dando ferozes dentadas com seus caninos a descoberto.
Com um golpe decisivo, Hércules derrubou o monstro.
Então Eurition, temeroso do bravo
guerreiro que estava diante dele, suplicou que lhe perdoasse a vida. Hércules
lhe atendeu o rogo.
Conduzindo a manada vermelha adiante de
si, Hércules voltou seu rosto para a Cidade Santa.
Não havia ido muito longe quando
percebeu uma nuvem de pó distante que rapidamente aumentava de tamanho. Supondo
que o monstro Gerion vinha em furiosa perseguição, se voltou para enfrentar o
inimigo. Pronto Gerion e Hércules estavam frente a frente. Soprando fogo e
chamas por suas três cabeças ao mesmo tempo, o monstro se encontrou com ele.
Gerion arrojou uma lança sobre Hércules que quase atingiu o alvo. Colocando-se
agilmente para um lado, Hércules esquivou o dardo mortal.
Estendendo seu arco, Hércules disparou
uma flecha que parecia incendiar o ar quando a soltou, e golpeou o monstro de
cheio em suas costas.
Com tão grande ímpeto havia sido
disparada a flecha que os três corpos do feroz Gerion foram atravessados. Com
um agudo e desesperante gemido, o monstro se inclinou, depois caiu para não se
levantar nunca mais.
Então Hércules conduziu para a Cidade
Santa o brilhante gado colorido. Difícil foi a tarefa. Muitas vezes alguma rês
se transviava e Hércules tinha que deixar a manada para ir à busca dos
vagabundos errantes. Ele conduziu a manada através dos Alpes e dentro da
Itália. Em qualquer lugar que a injustiça tivesse triunfado, ele assestava um
golpe mortal aos poderes do mal e endireitava a balança a favor da justiça.
Quando Erix, o lutador, o desafiou,
Hércules o derrubou tão violentamente que ali ficou. Da mesma forma quando o
gigante Alcione lançou sobre Hércules uma rocha que pesava uma tonelada, este a
aparou com sua clava e a lançou de novo para matar àquele que a havia enviado.
Às vezes se desorientava, porém Hércules
sempre regressava, desandava seus passos e prosseguia seu caminho. Embora
fatigado por este exigente trabalho, Hércules finalmente regressou.
O Mestre esperava sua chegada.
“Benvindo, Ó filho de Deus que és também
filho de homem. A joia da imortalidade é tua, com estes doze trabalhos tu superaste
o humano e ganhaste o divino. Chegaste ao lar, para não mais deixá-lo. No
firmamento estrelado será inscrito teu nome, um símbolo para os lutadores
filhos dos homens, de seu destino imortal. Terminados os trabalhos humanos,
tuas tarefas cósmicas começam. “ (BAILEY, 2008)
d)
Comentário:
A obediência é a característica
principal em Peixes. Obediência aqui não é apenas seguir ordens, mas manter
disciplina para avançar em direção à conclusão dos objetivos.
Salvar a manada vermelha (que simboliza
o povo que sofre na busca da libertação) e leva-la à Cidade Sagrada e durante
seu trajeto alguns se desgarravam. Hércules ia ao encontro dos errantes e os
conduzia de volta à manada: deve-se zelar por aqueles que se mantém na senda e
ainda por aqueles que dela se afastam.
Quando chegam no Templo os bois são
oferecidos em sacrifício e sua pele retirada, simbolizando a transcendência da
materialidade humana (a pele removida).
Os bois simbolizam também a vida
material e o gigante que os possui simboliza o apego do homem ao mundo
material. Apenas pela morte do gigante que se apega ao mundo material se pode
libertar o princípio espiritual do iniciado que o conduzirá à salvação.
Hércules não mata o pastor Euriton
(inimigo interno), mas apenas domina os efeitos do ataque do seu cão (desejos,
pulsão sexual descontrolada, vícios, etc). Por outro lado, Hércules mata o
gigante Gerion, símbolo do materialismo.
O iniciado em peixes mais uma vez
exercita sua capacidade de controlar os impulsos nocivos dos vícios sepultando
as energias matérias para então buscar sua salvação, a qual passa
invariavelmente pela salvação coletiva.
Figura 13:
Hércules luta pela posse do gado tartéssico de Gerião
4.
A Revolução
Historicamente os conhecimentos esotéricos,
que remetem ao conjunto de saberes necessário para o iniciado nos mistérios
trilhar o caminho de sua senda evolutiva, são protegidos por símbolos e
alegorias, especialmente por meio de lendas contadas de geração a geração, cuja
interpretação era concedida àqueles que recebiam de seus mestres as chaves
necessárias.
Na cultura grega a transmissão do
conhecimento sagrado ocorreu, na antiguidade, por meio da propagação de uma
série de lendas mitológicas que exigiam um conhecimento aprofundado de astrologia,
alquimia e outras ciências iniciáticas restritas a poucos.
O decurso do tempo (inclusive por meio
das múltiplas reencarnações segundo alguns) sempre foi a marca do percurso
necessário à evolução espiritual. Neste sentido, os doze trabalhos de Héracles,
dispostos ao longo do tempo decorrido na revolução do sol pelos signos
zodiacais, simbolizam o interstício (cíclico por sinal) necessário à evolução
do iniciado.
Bailey (2008) contribui em sua brilhante
análise ao contar a antiga história que, por meio de uma revolução solar,
transforma Alcides em Héracles. As vicissitudes de Héracles em seus doze
trabalhos proporcionam uma visão transcendental (que supera o literalismo do
texto mitológico) bem como uma série de realidades espirituais (relacionadas ao
embate entre virtudes e vícios) que são experimentadas na senda do iniciado.
A Maçonaria, e em especial o Rito
Escocês Antigo e Aceito, por ser um rito solar, cujo templo é justamente
sustentado por doze colunas zodiacais, encontra estreita semelhança com a epopeia
de Héracles em sua trajetória evolutiva: desde o recebimento da luz (conjunto
de saberes ocultos) até se tornar um portador da luz (em analogia à exaltação
do Mestre).
A epopeia de Héracles é a síntese
simbólica da luta da alma em busca da liberação de si mesmo pela exaltação de
características da personalidade superiores e pelo controle de energias mais
selvagens em prol da evolução integral de si mesmo e da humanidade.
“Ele (Hércules) representa o Filho de
Deus encarnado, mas ainda imperfeito, que definitivamente toma em suas mãos a
natureza inferior e, voluntariamente, submete-se à disciplina que fará emergir
o divino que carrega consigo. É a partir do homem que falha, mas que é
sinceramente sério e inteligentemente consciente do trabalho a ser realizado,
que se forma um Salvador do Mundo”. (BAILEY, 2008).
Neste sentido, a revolução solar (aí
referida à trajetória do sol pelos signos, ou de Héracles pelos trabalhos),
pressupõe pelo menos dois caminhos à evolução da alma humana:
“ 1. Um lento e contínuo crescimento
evolutivo, levado avante sob o efeito das Leis da Natureza, ciclo após ciclo,
até que gradualmente o lado divino começa a se expressar no homem;
2. Ou o resultado de sistemática
aplicação e disciplina por parte do aspirante, que permite o desabrochar mais
rápido do poder e vida da Alma. ” (NETTO, s.d., p.3)
Em
quase todas as tarefas, ao realiza-las, uma nova constelação surgia nos céus em
decorrência da ação de Héracles, a exemplo da constelação de Leo, originada a
partir da realização do trabalho perante o Leão de Nemeia. Cada avanço nos
trabalhos colocava mais luz nos céus (por novas constelações) de modo a
iluminar Héracles em seu caminho.
Ao
fim de sua trajetória, Hércules se torna portador da luz e, por isso, há
igualmente uma constelação com seu nome no firmamento.
Na Maçonaria, pode-se inferir a
seguinte trajetória na senda do iniciado, segundo Carpes (2012):
Alcides, o que nasceu filho do maior
dos Deuses comete o pior dos crimes ao assassinar sua família. Submete-se aos
desígnios da sentença do Oráculo e se humilha ao se submeter às ordens do Rei
Eristeu. Empreende uma longa jornada, onde se instrui a partir das experiências
no embate com os outros e especialmente consigo mesmo. Inicia a expiação
buscando salvar-se a si mesmo e a conclui como salvador da humanidade. O sol
que se põe na escuridão do facínora Alcides é o mesmo que se levanta na
trajetória solar do herói Héracles. Um mesmo sol, em revolução sobre os
diversos aspectos da persona, sepultando vícios e iluminando virtudes, na
melhor forma de se renovar a cada ciclo completo. Alcides e Héracles, um mesmo
homem, um só sol e uma só trajetória: a revolução de si mesmo.
“É o mesmo sol
que derrete a cera e seca a argila” ( Antoine de Saint-Exupéry )
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
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Robert. Introdução a Hesíodo. São
Paulo: USP, 1956.
BAILEY,
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Niterói: Fundação Cultural Avatar, 2008.
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Ilíada. Tradução de Frederico
Lourenço. Lisboa: Cotovia, 2005.
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Alfredo Roberto. Os doze trabalhos de
Hércules e a evolução da alma. Visão Esotérica. São Paulo, s.d., p.2.
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STEPHANIDES,
M. Hércules. Trad. MICHAEL, M. P. São Paulo: Odysseus, 2005.
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maçônico: dentro da tradição kabbalística. São Paulo: Madras, 2012.
[1]
Especial de Astrologia (Parte I de III). Disponível em <http://profeciasoapiceem2036.blogspot.com.br/2016/01/especial-astrologia-parte-i-de-iii.html>;
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[2]
Os doze trabalhos de Hércules, As Éguas
de Diomedes. Disponível em < http://wings-of-fairy.blogspot.com.br/2017/03/contos-os-doze-trabalhos-de-hercules-as.html>;
acesso em 26 setembro 2017
[3]
Hércules dominando o Touro de Creta. Disponível em < http://mitographos.blogspot.com.br/2015/11/hercules-os-doze-trabalhos-o-touro-de.html>;
acesso em 26 Setembro 2017
[4] Hercules Slaying The Dragon In The
Garden Of The Hesperides. Disponível em <
https://fineartamerica.com/featured/hercules-slaying-the-dragon-in-the-garden-of-the-hesperides-peter-paul-rubens.html>
; acesso em 26 Setembro 2017
[5]
Hércules e a Corça, estátua em bronze de Giambologna. Disponível em
<http://mitographos.blogspot.com.br/2015/10/hercules-os-doze-trabalhos-corca-da.html>;
acesso em 26 Setembro 2017-
[6] STEPHANIDES,
M. Hércules. Trad. MICHAEL, M. P. São Paulo: Odysseus, 2005.
[7]
O cinto de Hipólita. Disponível em < http://mitologia.blogs.sapo.pt/heracles-ou-hercules-e-o-cinto-de-140610>;
acesso em 27 Setembro 2017
[8] Hércules
e o Javali do Erimanto. Disponível em
<
http://mitographos.blogspot.com.br/2015/10/hercules-os-doze-trabalhos-o-javali-do.html>
; acesso em 27 Setembro 2017
[9]
Hércules e a Hidra de Lerna. Disponível em <
http://mitographos.blogspot.com.br/2015/10/hercules-os-doze-trabalhos-hidra-de.html>
; acesso em 27 Setembro 2017.
[10]
Hércules e as aves, tapeçaria do século XVI. Disponível em
< http://cidmarcus.blogspot.com.br/2014/06/as-aves-do-lago-estinfalo-na-arcadia.html>;
acesso em 27 Setembro 2017
[11]
Hércules e o cão de três cabeças Cérbero. Disponível em <https://br.pinterest.com/pin/812266482763981384/>;
acessível em 27 Setembro 2017
[12]
Os estábulos do Rei Áugias. Disponível em
< http://asolidaodocorredordasmilhasinvisiveis.blogspot.com.br/2012/01/os-doze-trabalhos-de-hercules-os.html
>; acesso em 27 Setembro 2017.
[13] Hércules
luta pela posse do gado tartéssico de Gerião. Disponível em <
http://arturjotaef-numancia.blogspot.com.br/2012/12/hercules-geriao-10-trabalho-de-hercules.html>
; acesso em 27 Setembro 2017
[14] O
caminho místico percorrido pelo iniciado in
A Revolução Solar e os Signos Zodiacais – Maçonaria & Astronomia,
apresentação de Flávio Carpes Moraes de 2012.
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