domingo, 5 de novembro de 2017

Acadêmico Marcio - Cadeira, 10

Academia Maçônica de Letras Sul-Rio-Grandense
Academia
A Revolução Solar: de Alcides a Héracles




Acadêmico Márcio Moraes dos Santos
Cadeira nº 10
Francisco Lobo da Costa

Porto Alegre, setembro de 2017


A Revolução Solar: de Alcides a Héracles


“A grande aventura existencial consiste em empreender uma longa jornada e depois de terminá-la chegar ao mesmo ponto de origem e admirá-lo como se fosse a primeira vez que o vê”.

Marcel Proust na obra Em Busca do Tempo Perdido

1.     A História ou a estória antes ou para além dos trabalhos
A história ou a estória de Héracles (cuja romanização legou a expressão Hércules) é a epopeia simbólica da alma humana em busca de sua libertação dos grilhões dos vícios de caráter e é contada pelo menos desde 3.000 a.C. A sucessão de trabalhos, ou tarefas, que a uma primeira vista se demonstra verdadeiro drama acaba por traduzir algo para além da dor recorrente das derrotas dramáticas relatadas na jornada. Os trabalhos evocam, apesar do drama, verdadeira tragédia, onde o herói sucumbe e se levanta a todo o momento, deixando para trás suas falhas e seguindo fortalecido, sem negar suas fragilidades, em direção às vitórias sobre si mesmo. Sim, o “si mesmo” é o maior inimigo de Hércules à despeito de toda adversidade que se apresenta nas tarefas.
“A descrição de suas tarefas, a história dramática de seus fracassos e conquistas, demonstram a mesma luta que enfrentamos nos dias de hoje em nossa própria evolução, pois, certos acontecimentos e episódios retratam, em qualquer época, a natureza do treinamento e realizações que caracterizam o ‘Caminho’ de qualquer homem que busca e se aproxima de sua ‘Libertação’. ” (NETTO, s.d.)

         Os trabalhos de Héracles, tão imemoriais quanto a própria cultura grega, possuem na Heracleia (ou Herácleda), poema épico perdido e escrito por Peisandro de Rodes em aproximadamente 600 a.C., um dos seus registros históricos mais antigos. Contudo, crê-se que a coletânea de trabalhos hoje existentes foi compilada de diversas fontes, tese evidenciada especialmente porque as narrativas possuem pouca coerência, inclusive geográfica, entre si.
         A narrativa de fundo da epopeia de Héracles começaria muito antes. Tomado por um episódio de cólera, fomentado pela ciumenta deusa Hera, Alcides (primeiro nome de Héracles, que significa “aquele que atrai as ideias”) matou os três filhos que havia com Mégara. Sentindo-se culpado pelas mortes, Alcides busca orientação junto ao famoso Oráculo de Delfos. A sentença expiatória do Oráculo foi a de que Alcides precisaria realizar doze façanhas sobre-humanas ordenadas por seu primo Eristeu (cujo significado é “aquele que te faz encontrar”), rei de Micenas. Naquela ocasião Alcides teve o nome trocado para Héracles, que significa “à glória de Hera” ou “aquele que vai em direção ao heroico”. Foi a pitonisa de Delfos quem primeiro chamou o heroi de Héracles, até então ele era conhecido pelo nome de Alcides.
         Netto (s.d.), sugere uma outra explicação ao nome de Hércules: “Hércules era o nome de sua Alma, enquanto Herakles do homem material; o primeiro nome era a expressão de sua origem paterna divina – o Espírito, enquanto o segundo era a expressão de sua origem materna humana – a Matéria. Daí a simbologia de semideus. ”
         Alcides era filho da rainha Alcmena (ou Arkmene) e Zeus (que a seduzira). A esposa de Zeus, a deusa Hera, enciumada pela traição do rei dos deuses olímpicos, tenta se livrar do jovem Héracles enviando duas serpentes venenosas. O bebê, semideus, pega as serpentes e ao aperta-las fortemente acaba por mata-las.  Assim, Alcides foi criado por aquele que pensava ser seu pai, o rei Anfitrião.
         Porém, ao que parece, o título de Héracles (ou Hércules) concedido a Alcides parece remontar à uma época muito mais pretérita:
“Muitos séculos antes da época na qual se diz ter vivido o filho de Alcmena, ou o pretenso herói de Tirinte, o Egito e a Fenícia, que certamente não foram à Grécia buscar os deuses que adoraram, tinham levantado templos ao sol sob o nome de Hércules, e levado o nome deles à ilha de Tasos e Cádiz, onde também havia se consagrado um templo ao ano, e aos meses que o dividem em doze partes, isto é, aos doze trabalhos ou às doze vitórias que deram à Hércules a imortalidade. ” (URBANO JR., 2012, p. 433)

         Nesta linha, o arquétipo de Héracles encontra ainda referência junto aos antigos egípcios que, segundo Plutarco, acreditavam que Hércules tinha sua sede no sol e que nele viajava em torno do mundo.
         A sequência canônica dos trabalhos advindos da consulta ao Oráculo está consolidada, segundo Ribeiro Jr (1998) pelo Pseudo-Apolodoro na sua Biblioteca e traz algumas peculiaridades: “(...) os seis primeiros trabalhos foram realizados na própria Grécia, mais especificamente no Peloponeso; os seis últimos levaram o herói ao ‘estrangeiro’ e alguns deles a lugares muito distantes e puramente míticos. ”.
         A mais antiga fonte aos trabalhos de Héracles se encontra na Ilíada (8.362-9), onde o personagem é classificado como um semideus caçador de leões.
         Amplamente representado na iconografia clássica, seja nos templos ou ainda nos vasos, Héracles enquanto arquétipo do homem em busca da evolução, se populariza no fim da Idade Média e no início do Renascimento segundo Ribeiro Jr. (1998) em diversas obras literárias, “(...) como o romance em prosa poética Le Fatiche d'Ercole, de Pietro Bassi (1475), o texto em prosa de Don Enrique de Villena, Los Doze Trabajos de Hercules (Zamora, 1483 e 1499), o romance anônimo Les Prouesses et vaillances du preux Hercule (Paris, 1500), logo traduzido para o inglês, o poema Dodeci Travagli di Ercole, de J. Perillos (1544) e uma coleção de adágios e alegorias de Fernandez de Heredia, Trabajos y afanes de Hercules (Madrid, 1682).”
         Sua lenda representa a luta de toda Alma que, vencidas as etapas iniciais da evolução comum, candidata-se à evolução consciente dos Iniciados, a qual levaria à imortalidade prometida na profecia da pitonisa de Delfos.
“O significado de um ‘Iniciado’, ou ‘Aspirante a....’ corresponde à etapa final da evolução na qual o Homem, ainda imperfeito, toma em suas mãos, intencionalmente, sua evolução e impõe a vontade de sua Alma sobre sua natureza inferior ou material. Seu trabalho consiste em libertar-se dos laços maternos (a Matéria), para assim responder ao amor do pai (o Espírito).(NETO, s.d.)
A epopeia de Hércules, em torno dos doze signos do zodíaco, pode ser analisada à luz do simbolismo maçônico igualmente expresso pelas colunas zodiacais do Templo e também pelas constelações dispostas no teto.

2.     Noções preliminares sobre os doze trabalhos.

O número doze simbolicamente remete a um ciclo completo, ou seja, à totalidade de um processo ou grupo de elementos. Os doze trabalhos de Héracles se organizam em torno de uma jornada pelos signos zodiacais e a tradição optou por analisar cada um dos trabalhos à aprendizagem vinculada ao signo do Zodíaco do qual faz parte.
Em linhas gerais pode-se afirmar que os doze signos do Zodíaco representam o conjunto de características ou qualidades da expressão humana, o que se pode denominar de “homem cósmico” em termos astrológicos.
Toda a narrativa dos doze trabalhos merece uma trina interpretação: literal (histórico mitológica), figurada (ou simbólica) e secreta (ou mística), especialmente porque há diferentes ordenações dos trabalhos a partir de diferentes autores. Aqui se opta pela compilação e ordenamento proposto por Bailey (2008).
Historicamente, como foi dito, o registro dos trabalhos invariavelmente remete ao poema sagrado denominado Herácleda, que canta as tarefas do herói ou ainda os trabalhos do sol solsticial. Sim, os doze trabalhos, de forma figurada, rendem homenagem ao sol, o qual Urbano Jr. (2012, p.433) denomina de “astro poderoso que anima e fecunda o universo; aquele cuja divindade em toda a parte de honrou com templos e altares. ”.
Nos Trabalhos, obra de Hesíodo há importante referência zodiacal a Héracles:
“(...) o zodíaco, no qual o sol completa seu curso anual, é o verdadeiro caminho percorrido por Hércules na fábula dos doze trabalhos, e que pelo seu casamento com Hebe, deusa da juventude, casamento que se realiza depois de terminado o movimento anual, deve estender-se a renovação do ano, no fim de cada revolução. ” (AUBRETON, 1956)

         Esta revolução zodiacal, que marcava o lapso de um ano, igualmente, por sua data de início, também assinalava a época de início dos jogos olímpicos, os quais se supunham terem sido instituídos por Héracles.
         O conteúdo do poema sagrado ultrapassa em muito a literalidade crível e oscila entre  o sentido figurado e o místico, tomando uma dimensão superlativa conforme anuncia Urbano Jr. (2012, p. 440): “ (...) todos os animais celestes postos em cena neste poema aparecem com um caráter que sai dos limites ordinários da natureza: os cavalos de Diomedes devoram homens; as mulheres elevam-se acima da timidez do seu sexo, e são formidáveis heroínas em seus combates; os pomos são de ouro; a corça tem pés de bronze; o cão Cérbero é eriçado de serpentes. Tudo, até o próprio caranguejo, é formidável no poema, e por quê? Porque tudo na Natureza é grande, bem como os símbolos sagrados que lhes exprimem as diversas forças. ”
         Assim, fica evidente que os fatos descritos nos trabalhos não foram históricos, mas sim astronômicos ou astrológicos, em que pese seu pretenso objetivo tenha sido o de, pela expressão artística poética, comunicar uma moral.
         A viagem pelas casas zodiacais encontra expressão simbólica na ornamentação do templo maçônico: o teto reflete a imagem do universo visível, firmamento onde as constelações que representam os signos repousam expressos nas doze colunas que sustentam o mesmo.
         Ao se falar de zodíaco é importante minimamente descrever este conceito, o que se faz na tradução livre da obra Zodiac: a life epitome:

“O Zodíaco, propriamente falando, é aquele cinturão nos céus através do qual passa o aparente caminho do Sol; seu ponto inicial é o do Equinócio Vernal que, como sabemos, está em movimento retrógado contínuo através de um círculo de constelações que ficam perto da eclíptica. O Zodíaco está dividido em doze porções iguais de 30 graus cada, quase que correspondendo às doze constelações de Áries, Touro, Gêmeos, Câncer, Leão, Virgem, Libra, Escorpião, Sagitário, Capricórnio, Aquário e Peixes. ” (SAMPSON, 2003)
Para melhor compreensão da trajetória anual do sol ao longo do caminho dos signos zodiacais pode-se conceber a seguinte imagem:

Figura 1: O Zodíaco

         É justamente esta marcha do Sul que é representada simbolicamente nos doze trabalhos realizados por Héracles a fim de expiar sua culpa pelo assassínio dos filhos (inclusive da esposa) e assim se tornar um ser aperfeiçoado.
         O sujeito se torna Héracles (espírito) quando abandona seu vínculo à matéria (Alcides), ou seja, quando se afasta de todos os vícios que lhe aprisionam a condutas mundanas e, por meio de uma jornada iniciática interior (V.I.T.R.I.O.L.), busca sua evolução espiritual. Para empreender tamanha jornada precisa:
a)     Adquirir o entendimento de que toda a expressão material do Universo é simbólica e transitória, inclusive seu próprio corpo;
b)    Aceitar que a realidade de Deus é indiscutível, sendo uma verdade absoluta na consciência de qualquer iniciado;
c)     Crer que é um filho de Deus, criado à Sua imagem.
Somente ao se integrar a estas conquistas decorrentes de sua viagem interior primeira o homem pode então empreender a longa jornada dos doze trabalhos iniciáticos de Héracles. Não é, pois, uma cerimônia de iniciação que torna o sujeito iniciado. O caminhante se lapida caminhando.
Alcides ruma a Delfos onde descobre sua longa jornada iniciática em direção a Héracles.
Aqui, propositadamente, a fim de se discutir de maneira relacionada o desenvolvimento moral evocado pelo conjunto dos trabalhos, optou-se por inicia-los em Áries, o roteiro mais comum dos trabalhos.

3.     Os doze trabalhos de Héracles (ou Hércules)

3.1   Primeiro Trabalho: Áries, a captura das éguas devoradoras de homens.
a)     Sol em Áries: de 21 de março até 20 de abril.
b)    Significado: o aprendizado sobre o controle da mente.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“O PRIMEIRO Portal estava aberto de par a par. Uma voz chegou através de Portal:
- “Hércules, meu filho, sai. Passa pelo portal e entra no Caminho. Realiza teu trabalho e volta a mim, relatando o fato”.
Com gritos de triunfo, Hércules se lançou, correndo entre os pilares do Portal com arrogante confiança e segurança de poder.
O filho de Marte, Diomedes, de ardente fama, governava na terra além do Portal e ali criava os cavalos e as éguas de guerra, nos pântanos de sua herdade. Os cavalos eram selvagens e as éguas ferozes, e todos os homens tremiam ao ouvir seu tropel, pois eles assolavam por todas as partes da terra, produzindo grande dano, matando a todos os filhos dos homens que cruzassem seu caminho e engendrando constantemente cavalos mais selvagens e malignos.
“Captura estas éguas e detém estes atos malvados”, foi a ordem que se abateu nos ouvidos de Hércules. “Vai, liberta esta terra longínqua e os que vivem nela”
“Abderis. ”, gritou Hércules, “adianta-te e ajuda-me nessa tarefa”, chamando o amigo a quem amava profundamente e que o seguia sempre em seus passos enquanto ia de um lugar para o outro. Abderis se adiantou e tomou seu lugar ao lado do amigo e com ele enfrentou a tarefa. Traçando todos os planos com cuidados, os dois seguiram os cavalos enquanto percorriam as pradarias e os pântanos dessa terra. Finalmente, Hércules conseguiu confinar as éguas selvagens dentro de um campo onde não havia mais lugar para se moverem, e ali as prendeu e as manietou. Depois, deu um grito de alegria pelo triunfo conseguido. Tão grande foi seu deleite na proeza assim posto de manifesto que ele considerou por baixo de sua dignidade pegar as éguas ou conduzi-las no caminho para Diomedes. Chamou o seu amigo, dizendo: “Abderis, vem aqui e conduz estes cavalos através do portal”. Deu as costas e marchou orgulhosamente para diante.
Porém Abderis era débil e sentiu medo pela tarefa. Não pôde reter as éguas ou colocar nelas os arreios ou conduzi-las através do Portal, atrás das pegadas de seu amigo. As éguas se voltaram contra ele, desgarraram e o pisotearam, matando-o e depois escapando para as terras mais selvagens de Diomedes.
Mais prudente, desconsolado, humilde e desanimado, Hércules voltou a sua tarefa. Procurou de novo às éguas de lugar em lugar, deixando o seu amigo agonizante sobre a terra. Novamente prendeu os cavalos e os conduziu, ele mesmo, através do Portal. Porém Abderis jazia morto.
O Mestre tudo examinou com cuidado e enviou os cavalos a um lugar de repouso, para ali serem domados e reduzidos à sua faina. O povo dessa terra, libertado do temor, deu as boas-vindas a quem lhes havia libertado, aclamando Hércules como salvador da Terra. Porém Abderis jazia morto.
O Mestre se voltou para Hércules e disse:
- “O primeiro trabalho está terminado; a tarefa está feita, porém malfeita. Aprende a verdadeira lição desta tarefa e depois passa a outro serviço em favor de teu próximo. Sai para a região do Segundo Portal. Encontra e faz entrar o touro sagrado ao Lugar Sagrado”. ” (BAILEY, 2008)
d)    Comentário:
Héracles inicia este primeiro trabalho talvez ainda influenciado por todo tipo de vício moral que outrora lhe tornou o descontrolado assassino de seus filhos. Arrogância, excesso de confiança e segurança de poder dar conta do trabalho são as características psicológicas marcantes ao início deste trabalho. A arrogância foi tamanha que, tendo logrado êxito na missão, entendia que a condução das éguas capturadas seria atividade abaixo de sua dignidade, motivo pelo qual a lega ao seu frágil amigo Abderis. O resultado é a morte do amigo, que não tinha a mesma capacidade de Héracles. Um incapaz mais uma vez morre pelo descontrole de Alcides. O trabalho precisou ser refeito e finalmente as éguas foram conduzidas por Héracles através do Portal: trabalho feito, mas mal feito.
         É justamente por denotar a necessidade do controle mental que os trabalhos de Héracles se iniciam em Áries.
Ás éguas devoradoras de homens simbolizam os pensamentos que inebriam a mente dos homens tomando-lhes o controle dos atos e fazendo-os precipitados.
A tarefa do controle da mente é uma atividade da alma (de Héracles) e não pode ser legada a qualquer outro incapaz sob pena do insucesso: a morte de Abderis (aqui representando a personalidade) pisoteado pelos “pensamentos”.
Há uma variante a este trabalho denominado “As éguas de Diomedes” cujo significado remete à perversidade humana:
“        Diomedes era rei da Trácia. Possuía quatro éguas (Podarga, Lampona, Xanta e Dina), que se alimentavam de carne humana. Eristeu encarregou Hércules de acabar com essa prática selvagem e trazer as éguas para Argos.        
Esse mito simboliza o fato de que na vida humana há muita perversidade. Há homens que devoram outros para satisfazerem seus instintos mais vis. Os perversos, quando vencidos, morrem por si mesmos, destruídos pelos próprios inimigos que criou, ou por outras feras iguais a eles. Mas nesse processo ocorre também a morte da beleza, da inocência e da pureza simbolizadas pela rainha Alceste. O trabalho do iniciado é resgatar desse tipo de “ morte” moral, as pessoas boas e puras que são vítimas dessa perversidade. ” (ANATALINO, 2010)
e)     Ilustração:
Figura 2: As éguas de Diomedes

3.2           Segundo Trabalho: Touro, a captura do touro de Creta.
a)     Sol em Touro: de 21 de abril até 20 de maio.
b)    Significado: o aprendizado sobre a natureza dos desejos.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   O Grande Senhor falou ao Mestre do homem cuja luz brilhava entre os filhos dos homens. Que também são filhos de Deus:
- “Onde está o homem que se manteve com poder diante dos Deuses, recebeu dons e entrou pelo primeiro portal aberto de par em par para trabalhar em sua tarefa? ”
- “Ele descansa, ó Grande Presidente e reflete acerca de seu fracasso, lamentando-se por Abderis e busca ajuda dentro de si mesmo”.
- “Muito bem. Os dons do fracasso garantem o êxito quando são corretamente compreendidos. Que proceda a trabalhar mais uma vez e penetre pelo Segundo Portal! ”.
Só e triste, consciente da necessidade e consumido por uma profunda dor, Hércules passou lentamente entre os pilares do Segundo Portal para a luz que brilhava onde estava o touro sagrado. No horizonte se levantava a formosa ilha onde morava o touro e onde homens arrojados podiam entrar no vasto labirinto que os atraía até o aturdimento, o labirinto do Rei de Creta, o guardião do Touro.
Cruzando o oceano para a ensolarada ilha, Hércules empreendeu sua tarefa de encontrar o touro e conduzi-lo ao Lugar Sagrado onde moram os homens de um olho só (os grandes Iniciados que desenvolveram a terceira visão) de um lugar ao outro, ele perseguiu o touro sagrado dentro do labirinto, guiado pela fulgurante estrela que brilhava sobre a fronte do touro. Sozinho, ele procurava o touro; sozinho ele o perseguia até a sua guarida; sozinho ele o capturou e montou sobre seu lombo.
As suas voltas permaneciam as Sete Irmãs, estimulando-o em seu caminho e, na luz resplandecente, ele o conduzia, entregando-o depois aos 3 ciclopes. Estes três grandes filhos de Deus aguardavam seu regresso, vigiando seu progresso através das ondas.
Ele conduziu o touro como se este fosse um cavalo e com as 7 irmãs cantando, à medida que marchava.
Vem com força, disse Brontes; conduz na luz, disse Steropes, tua luz interior será mais brilhante; vem rápido, disse Arges, pois estás conduzindo através das ondas.
Hércules se aproximou empurrando o touro sagrado e emitindo luz sobre o caminho que conduzia de Creta ao Templo do Senhor.
Sobre a terra firme, a beira d’água, estes três pararam Hércules e se apoderaram do touro.
- Que tens tu aqui? Disse Brontes, detendo Hércules no caminho.
- O touro sagrado, ó Deus.
- Quem sois? Diga-nos teu nome, disse Steropes.
- Eu Sou o filho de Hera, um filho de homem e, contudo, um filho de Deus. Realizei minha tarefa.
- Leva agora o Touro ao Lugar Sagrado e o salva, pois Minos desejava seu sacrifício. ” (BAILEY, 2008)

d)    Comentário
Sob o aspecto esotérico o touro é relacionado às pulsões de vida e de morte bem como à energia sexual que é a força motriz destas pulsões e da capacidade criativa. Da mesma forma que a energia sexual é responsável pelo aprisionamento do sujeito em torno de diversos vícios ela também serve de portal para acesso a níveis mais espiritualizados. Alcançar tal evolução espiritual é algo que acontece por meio do domínio do desejo, representado na alegoria do domínio do touro.  Este touro que precisa ser salvo é a energia sexual.
Sublimar a energia sexual é a tarefa iniciática necessária para se direcionar ao Eu interior e ao mesmo tempo de afastar do inimigo secreto (o ego e os vícios), representado por Minos na alegoria.
“A luz na testa do Touro é a Estrela de Aldebaran da constelação de Touro e as sete irmãs são as sete Plêiades que na história representam os Arcanjos Guardiões dos Sete Portais, ou seja, os sete centros de força do homem. ” (URBANO JR, 2012, p.448)

         Pressupõe-se que ao dominar o Touro o iniciado internaliza a Lei da Atração por sua integral compreensão.
         Pode-se deduzir uma interpretação simbólica das advertências dos Titãs:
i)                   “Vem com força” significaria vem com a força sexual necessária para a própria vida;
ii)                “Conduz na luz” significaria que a energia sexual deve ser empregada aos mais elevados propósitos;
iii)              “Vem rápido, pois estás conduzindo através das ondas” significaria que o iniciado não deve se deixar envolver em aspectos emocionais primitivos, como os desejos sexuais desagregadores, em sua jornada iniciática.
Ilustração:
Figura 3: Hércules dominando o Touro de Creta, estátua de August Kriessmann, Alemanha

3.3           Terceiro Trabalho: Gêmeos, a colheita das maças (pomos) de ouro do jardim das Hespérides.
a)     Sol em Gêmeos: de 21 de maio até 20 de junho.
b)    Significado: o conhecimento de si próprio.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   Hércules pergunta ao seu Mestre: Diga-me o Caminho, Ó Mestre de minha Alma. Eu busco as maçãs de Ouro (fruto da Árvore da Sabedoria). Eu as necessito rapidamente para meu proveito. Mostra-me o caminho mais rápido e irei!
Resposta do Mestre:
“Não é assim, meu filho. O Caminho é longo. Só duas coisas te confiarei e, depois, a ti corresponderá comprovar a verdade do que digo.
1ª. Lembra que a árvore sagrada está bem custodiada. Três formosas donzelas apreciam a árvore, protegendo bem seu fruto. Um Dragão de cem cabeças protege as donzelas e a árvore. Guarda-te bem da força demasiado grande para ti, dos enganos demasiado sutis para tua compreensão. Vigia bem.
2ª. A Segunda coisa que eu te diria é que tua busca te levará onde te encontrarás com cinco grandes provas no caminho. Cada uma te proporcionará o âmbito para a Sabedoria, a compreensão, a destreza e a oportunidade. Vigia bem.
Temo, meu filho, que tu fracassarás em reconhecer estes pontos sobre o Caminho. Porém, só o tempo o mostrará; Deus te acompanhe. ”
Confiante, porque pretendia o êxito e não o fracasso, Hércules se pôs a caminho, seguro de si mesmo, de sua sabedoria e de sua força.
Buscou primeiramente por toda a região Norte do planeta, procurando a árvore sagrada. Perguntou a todos os homens que encontrou, porém nenhum lhe soube responder. O tempo passou, embora ele continuasse procurando de lugar em lugar e muitas vezes voltou sobre seus próprios passos em sua denodada busca.
Embora triste e desanimado, continuou em sua meta.
O Mestre, vigilante, de longe o acompanhava e enviou Nereu para ver se podia ajudar. Este veio repetidas vezes em forma variável e com diferentes palavras de verdade, porém Hércules não respondia, nem sabia que o mensageiro era para ele. Não reconheceu a ajuda tão sutilmente oferecida.
A primeira das cinco provas menores tinha passado e o fracasso caracterizou esta etapa.
Enveredou então pelo Caminho do Sul, o lugar da escuridão. À princípio sonhou com o êxito rápido, porém Anteo, a serpente, o encontrou nesse caminho e lutou com ele, vencendo-o em todas as ocasiões. “Ela custodia a árvore”, pensou Hércules; a árvore deve estar muito perto dela.
Devo acabar com seu guardião e assim, destruindo-o, abaterei a árvore e colherei seus frutos. Contudo, apesar de lutar com muita força, ele não triunfava sobre Anteo.
- “Onde está minha falta? Por que Anteo pode vencer-me, se ainda quando bebê eu destruí uma serpente em meu berço com minhas próprias mãos. Por que fracasso agora? ”
Lutando com todo o seu poder, ele agarrou a serpente com abas as mãos e elevou-a no alto, afastando-a do solo. A luta estava terminada, pois Anteo perdeu suas forças, mas antes disse: Virei outra vez com diferente aparência no oitavo portal. Prepara-te para lutar.
Feliz e confiante, Hércules continuou seguro de si mesmo e se voltou para o Oeste, onde encontrou o desastre, pois entrou, sem perceber, na 3a. grande prova, onde permaneceu longo tempo sem avançar, pois, ali encontrou Busiris, o grande enganador, filho das águas e parente próximo de Poseidon. Seu trabalho é conduzir os filhos dos homens ao erro, através de palavras de aparente sabedoria, afirmando conhecer a verdade e, com rapidez, os homens que procuram um mestre fora de si mesmos, acreditam nele. Ele fala belas palavras dizendo: - “Eu sou o Mestre. A Mim
me foi dado o conhecimento da verdade e deveis fazer sacrifícios por mim. Aceitem o caminho da vida através de mim. Somente eu sei a verdade e ninguém mais. Minha verdade é justa. Qualquer  outra razão é errada e falsa. Escutem minhas palavras, permaneçam comigo e serão salvos”.
E Hércules obedeceu; diariamente seu entusiasmo pelo caminho primitivo (a terceira Prova) debilitou-se e já não procurava mais conquistar a árvore sagrada. Sua força se esgotou. Ele amou, adorou a Busiris e aceitou tudo o que ele dizia. Sua debilidade crescia dia após dia, até que chegou a época em que seu amado mestre o amarrou a um altar e o manteve atado durante um ano.
Um dia, cansado e quando já estava lutando para libertar-se, lentamente veio à sua mente palavras ditas por Nereu havia muito tempo: A VERDADE ESTÁ EM TI MESMO. Em ti existe um poder, uma força que jaz ali, o poder que é a herança de todos os filhos dos homens que são os filhos de Deus. Neste instante, calmo, olhou para Busiris, por cuja causa estava nesse transe e havia permanecido prisioneiro, atado aos quatro cantos do altar, por um ano inteiro.
Então, com a força que é inerente a todos os filhos de Deus, rompeu suas amarras, pegou o falso mestre (que havia parecido ser tão sábio) e o atou ao mesmo altar no lugar que ocupara. Não disse nada, porém o deixou ali para aprender a não enganar outros filhos do homem.
E seu Mestre Real percebeu o momento da libertação e voltando-se para Nereu, disse: A 3a. Grande prova foi vencida. Tu Nereu lhe ensinaste como encontrar a saída e, a seu devido tempo, ele soube encontrá-la. Que siga adiante.
Instruído, e sem interrogações maiores, Hércules continuou com sua busca e percorreu muitos caminhos. O ano que tinha passado inclinado no Altar de Busiris lhe havia ensinado muito e, por isso retornou com maior sabedoria à sua senda.
Repentinamente, deteve seus passos. Um grito de profunda dor feriu seus ouvidos. Alguns abutres, dando voltas sobre uma rocha distante chamou sua atenção; então ouviu novamente o grito. Devia prosseguir seu caminho, ou buscar aquele que parecia estar em necessidade e assim atrasar seus passos? Refletiu sobre o problema da demora: um ano havia perdido e sentiu a necessidade de apressar-se. Outra vez ouviu um grito romper o ar e Hércules, com passos rápidos, se apressou a ir à ajuda de seu irmão que sofria. Foi quando se deparou com Prometeu acorrentado a uma rocha, sofrendo dores terríveis causadas pelos abutres que bicavam seu fígado, matando-o pouco a pouco.
Imediatamente Hércules rompeu a corrente que o sujeitava e libertou-o afugentando os abutres para sua distante guarida e depois, cuidou do enfermo até que se recuperasse totalmente das feridas. Então, com muita perda de tempo, novamente começou a por-se no caminho. Neste instante, sentiu dentro de si a voz de seu Mestre Real, que lhe disse: - “A 4a. prova no caminho sagrado estava se realizando com aproveitamento. Não havia ocorrido nenhum atraso. A regra que apressa todos os êxitos no caminho eleito, é: APRENDE A SERVIR”.
E Hércules continuou sua busca da árvore sagrada, agora se dirigindo para o Leste.
Um dia, já cansado de viajar, ouviu, de um peregrino passante que, próximo a uma montanha distante, a árvore sagrada seria encontrada. Imediatamente ele colocou seus pés no caminho e num dia ensolarado, viu o objeto de sua busca.
Apressando seus passos, gritou em sua alegria: - “Agora tocarei a Árvore Sagrada; vencerei o dragão que lhe custodia; verei as formosas donzelas de grande fama e colherei as maçãs de ouro”.
Porém, novamente foi retido por um sentimento de profunda compaixão. Atlas estava à sua frente, cambaleante sob a carga do Mundo sobre seus ombros. Seu rosto estava marcado pelo sofrimento, seus membros estavam curvados pela dor; seus olhos estavam cerrados pela agonia; ele não pedia ajuda; também não viu a Hércules, mas permanecia encurvado pela dor, pelo peso do mundo. Hércules, tremendo, observou e avaliou o peso da carga e da dor de Atlas. Esqueceu sua busca. A Árvore Sagrada e as maçãs de ouro desapareceram de sua mente e somente procurou ajudar o gigante, e isso sem pestanejar. Lançou-se para adiante e ansiosamente tirou a carga dos ombros de seu irmão, levantando-a sobre seus próprios ombros, tomando para si o castigo de sustentar o mundo. Fechou seus olhos, firmando-se com esforço, e eis que a carga rodopiou no espaço, onde permanece até hoje, deixando ele e também Atlas livre.
Diante dele estava parado o gigante Atlas e em suas mãos estavam às maçãs de ouro, oferecendo-as, com amor, a Hércules. A busca havia terminado.
As três irmãs sustentavam ainda mais maçãs de ouro e o instavam também a recebê-las de suas mãos, e Eglé a formosa donzela que é a gloria da vida e o esplendor do sol poente, lhe disse, colocando uma maçã em sua mão: O caminho para nós é sempre marcado por atos de amor.
Depois Eritheia, que cuida da porta que todos devemos passar antes que elas se fechem sozinhas ante o Grande que preside, deu-lhe uma maçã, e em suas costas, inscrita com luz, estava a palavra dourada: Serviço.
Lembra isto, disse, não esqueça.
E, finalmente chegou a Hespérides (Vontade), a maravilha da estrela vespertina, e lhe disse com clareza e amor: Sê e serve, e percorre o caminho de todos os servidores do mundo daqui por diante e para sempre.
- “Então restituo estas maçãs para aqueles que seguem a mesma rota”, disse Hércules, regressando para onde tinha começado sua luta.
Parou ante o Mestre e deu conta de tudo o que havia acontecido. O Mestre lhe expressou sua alegria e, em seguida, indicando com o dedo, assinalou o Quarto Portal e lhe disse: passe através deste Portal e captura a corça com chifres de ouro e patas de bronze e penetra uma vez mais no Lugar Sagrado. ” (BAILEY, 2008)

d)    Comentário
O signo de Gêmeos se refere ao conhecimento (de si próprio) que é o ato de colher os pomos de ouro, os quais são os frutos do conhecimento (do bem e do mal), arquétipo presente em diversas culturas. A colheita e refere ao domínio que o iniciado realiza sobre seu corpo físico e sobre o desejo através da razão.
As maças também se referem a um tipo especial de conhecimento, a sabedoria, que só é obtida por meio do conhecimento interno.
Nereu representa a inspiração divina que ilumina o iniciado e Busiris os falsos mestres que se lhe apresentam ao caminho.
A sabedoria só se conquista por meio do serviço (ao próximo), o qual carece de compaixão e espírito de sacrifício perante o outro.
O grande ensinamento da alegoria deste trabalho é o de que a evolução espiritual não depende da luta contra o mal, mas da aquisição de valores virtuosos por meio da lapidação interior.
e)     Ilustração:
    
          Figura 4: Hercules Slaying The Dragon In The Garden Of The Hesperides

3.4           Quarto Trabalho: Câncer (Caranguejo), a captura da corça com chifres de ouro.
a)     Sol em Câncer: de 21 de junho até 21 de julho
b)    Significado: o desenvolvimento da intuição.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   Hércules, depois de receber a tarefa de capturar a Corça com chifres de ouro está diante do quarto Grande Portal. Não pronuncia nenhuma palavra nem nenhum som. Além deste Portal se estende uma paisagem com contornos despojados e no horizonte afastado se levantava o templo do Senhor, o santuário do Deus-Sol.
Sobre uma colina próxima estava parado um belo espécime da família dos cervos e Hércules olhou e escutou e, escutando, ouviu uma voz. A voz saía do brilhante círculo da Lua, que é o lar de Ártemis filha de Zeus e Leto e irmã gêmea de Apolo. No panteão romano foi identificada com Diana, a caçadora. E Ártemis, a fada, falou palavras de advertência ao filho de Deus: - “A corça é minha, portanto, não a busques”, disse ela. “Durante eras eu a alimentei e a cuidei quando jovem. A corça é minha e minha deve permanecer”.
Então surgiu Diana, a caçadora dos céus, a filha do sol. Saltando para a cerva, ela também reclamou a posse da mesma: “Não é assim”, disse a formosa donzela; a corça é minha e minha deve permanecer.
Hércules parado entre os pilares do Portal escutou a querela entre as Deusas e muito se assombrou enquanto as duas donzelas disputavam à posse da corça.
Outra voz assaltou seu ouvido e com dominante acento disse: “A corça não pertence a nenhuma donzela, ó Hércules! senão a Deus, cujo santuário tu vês no monte distante. Vai e resgata-a e depois leva-a em segurança ao santuário e deixa-a ali. Uma tarefa simples de fazer, ó filho de Deus! porém (e medita bem minhas palavras) sendo um filho de Deus, tu podes, assim, buscar e pegar a corça. Vai.
Hércules saiu através do 4o. Portal deixando atrás de si os muitos dons recebidos afim de que não estorvassem a veloz perseguição que tinha por diante e, de certa distância, era observado pelas donzelas discutidoras. Artemísia e Diana seguiam os movimentos da corça e quando ela surgia para Hércules, cada uma delas enganava-o, buscando frustrar seus esforços. Hércules perseguia-a de um ponto a outro e cada uma delas com sutileza o enganava e, assim, procederam várias vezes.
Pelo espaço de um ano, Hércules perseguiu a corça de lugar em lugar, vendo apenas ligeiros reflexos de sua forma, tendo chegado a concluir, ao penetrar as regiões mais profundas do bosque, que a tinha perdido. De colina em colina, de bosque em bosque, ele a perseguiu até muito próximo de um tranquilo lago onde, de corpo inteiro, sobre a relva não pisada, ele a viu dormindo, cansada de suas carreiras.
Com passo silencioso, mão estendida e olho fixo, ele disparou uma flecha para a corça e a feriu em sua pata. Estimulando toda a vontade da qual estava possuído, se aproximou mais e, contudo, a corça não se moveu. Assim, se adiantou mais próximo e envolveu-a em seus braços próximo de seu coração, sendo observado por Artemísia e Diana.
A busca havia terminado, cantou em voz alta: - “A corça agora é minha! ”
“Isto não é verdade, ó Hércules! ”, ouviu a voz de alguém que permanece próximo ao Grande Presidente dentro da Câmara de Concílio do Senhor. A Corça não pertence ainda aos filhos de homens, mesmo que seja um filho de Deus. Leva a corça a aquele Santuário, onde moram os Deuses e deixa-a ali, com eles.
- “Por que deve ser assim, ó sábio Mestre? A corça é minha; minha pela longa busca e a longa viagem que fiz e, por confirmação, sustento-a perto de meu coração”.
-”E não é tu um filho de Deus, embora também um homem”? E não é este santuário também tua morada? E não compartes tua vida com todos os que moram aí dentro? – “Leva ao Santuário de Deus a corça sagrada e deixa-a ali, ó Filho de Deus”.
E Hércules assim procedeu. ” (BAILEY, 2008)
d)    Comentário:
O signo de câncer é o signo da intuição por ser introspectivo e ao mesmo tempo relacionado à descoberta da capacidade interior da mente. A intuição transforma o intelecto justamente por não ser uma faculdade que se desenvolve em termos lógicos: ela aparece e desaparece subitamente e mesmo assim é de grande importância para a apreensão da realidade.
Deixar para trás parte de si, especialmente as crenças da mente, é condição necessária para se capturar a corça (a intuição).
“Artêmis, a deusa lunar relacionada astrologicamente com a imaginação instintiva, diz-se dona da corça.
Diana, a deusa Caçadora, relacionada à ardilosidade mental, também se dizia dona da corça. ” (URBANO JR, 2012, p.456).
         O problema que se coloca diante do iniciado é justamente o de saber usar o instinto de maneira própria e no local adequado.
         Se em Áries se pode falar em uma mente impulsiva, em Touro se fala da mente do desejo (controle dele), em Gêmeos da mente intelectual e, por fim, de forma complementar, em Câncer da mente intuitiva.
e)     Ilustração:

            Figura 5: Hércules e a Corça, estátua em bronze de Giambologna

3.5           Quinto Trabalho: Leão, matando o Leão de Nemeia ou trazendo o couro do Leão
a)     Sol em Leão: de 22 de junho até 21 de agosto.
b)    Significado: a partir dos aprendizados anteriores deve-se utilizar o poder e a coragem para educar (submeter) a violência (interior).
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   O Grande Presidente, dentro da Câmara do Concílio do Senhor (O EU SOU), observava o repouso do guerreiro cansado e vigiava seus pensamentos. Dirigiu-se ao Mestre que se mantinha ao seu lado, dentro da Câmara do Concílio do Senhor: - “O tempo para um terrível trabalho está prestes a acontecer. Este homem, que é um filho de homem e não obstante um filho de Deus, deve estar preparado. Que verifique as armas que possui e que mantenha polido o seu escudo e que submerja suas flechas numa mistura letal, pois horrível e espantoso é o trabalho que tem pela frente. Que se prepare”.
Entretanto, Hércules descansava de seus trabalhos e não tinha nenhuma informação sobre o que o esperava. De vez em quando, lembrava gostosamente quando, além do Quarto Portal, persegue a Corça Sagrada até o Templo do Senhor e esta, porque agora já o conhece bem, sempre atende gentilmente aos seus chamados, permitindo que ele a coloque sobre o seu coração.
Sendo requisitado novamente, Hércules se colocou diante do Quinto Grande Portal, armado até os dentes com todos os instrumentos de guerra a que tinha direito um verdadeiro guerreiro e enquanto ele se mantinha ereto, os deuses vigilantes observavam seu passo firme, seu olhar ansioso, sua mão pronta para a luta.
- “Que faço eu aqui? Perguntou ele. “Qual a prova - e por que estou necessitado de passar este Portal? ”
Falando assim, ele escutava esperando ouvir uma voz. – “Que faço eu aqui, Ó Mestre de minha vida, armado como Tu vês, com toda a panóplia de guerra? Que faço eu aqui?”
- “Soou um chamado, Hércules, um clamor de profunda dor. Teus ouvidos exteriores não responderam a esse chamado e, não obstante, o ouvido interno conhece bem a necessidade, pois ele ouviu uma voz, sim, muitas vozes, falando da necessidade, do apelo para que tu te arrisques novamente.
O povo de Neméia pede ajuda para que Hércules os livre de um leão que os apavora e angustia. A notícia de tuas proezas se alardeou. Eles pedem que tu mates o leão que devasta sua região, fazendo vítimas entre os homens.
- “E esse o ruído que ouço”? Perguntou Hércules. É o rugido de um leão que escuto no ar vespertino?”
O Mestre disse: - “Vai, busca o leão que assola a região situada na parte mais distante do Quinto Portal. O povo desta assolada comarca vive silenciosamente detrás de suas portas com ferrolho; não se aventuram sair para cumprir suas tarefas, nem cultivar suas terras, nem semeiam. De norte a sul, do leste a oeste o leão saqueia e espreitando captura a todo aquele que cruza seu caminho. Seu espantoso rugido é ouvido ao longo da noite e todos estão tremendo detrás de suas portas trancadas. Que farás, Ó Hércules? Que farás?”
Hércules, prestando atenção, respondeu à necessidade.
No lado mais próximo do grande Portal que custodia firme a região, ele deixou cair as armas de guerra retendo para seu uso o garrote, cortado por suas mãos, de uma árvore jovem e primaveril.
- “Que estás fazendo, ó filho de homem, que sois também um filho de Deus?”
- “Este admirável conjunto de armas só me oprime, atrasa minha velocidade e obstrui minha marcha no caminho. Não necessitarei nada senão minha robusta maça e, com esta clava e meu intrépido coração, irei por meu caminho procurar o leão. Comunica ao povo de Neméia que vou pelo Caminho e diga-lhes que abandonem seu temor”.
Durante longo tempo Hércules procurou o Leão. Muitos dias e muitas noites se passaram com ele explorando o Caminho e prestava ouvidos ao rugido do leão, enquanto o povo de Neméia se protegia atrás das portas fechadas.
De repente viu o leão. Estava parado à beira de um espesso matagal. Vendo o inimigo que se aproximava e que parecia completamente sem temor, o leão rugiu, e com seu rugido os arbustos balançaram, o povo de Neméia fugiu e Hércules permaneceu imóvel.
Empunhou seu arco e seu estojo de flechas e, com mão segura e olho esperto, apontou uma flecha no lombo do leão. A flecha resvalou e caiu sobre a terra, sem atravessar o lombo do leão. De novo e repetidamente ele disparou suas flechas sobre o leão até que não restou uma flecha em seu carcás. Então o leão partiu para ele intocado, ileso e enfurecido, completamente sem temor. Arrojando seu arco sobre a terra, o filho do homem, que é um filho de Deus, se lançou também com um grito selvagem para o leão que estava na Senda, bloqueando seu caminho, espantado da proeza com a qual até então não se havia encontrado. Hércules avançava.
Repentinamente, o leão se voltou e bateu em retirada, fugindo pelo matagal e desapareceu. E assim continuaram os dois. Repentinamente, enquanto corria pelo
Caminho, o leão desapareceu e não foi visto nem se o ouviu mais.
Hércules se deteve no Caminho e permaneceu silencioso. Ele procurava em todos os lados, empunhando seu firme garrote. Por todos os lados ele buscava; passava por todos os caminhos, indo de um ponto a outro sobre a longa Senda que corria contra os flancos da montanha. De repente, se aproximou de uma cova e dali ecoou um forte rugido, uma voz selvagem, surda e retumbante, que parecia dizer-lhe que se detivesse ou perderia sua vida. Hércules permaneceu quieto, gritando para o povo da região: - “o Leão está aqui. Aguardem minha façanha”. E Hércules que é um filho de homem e, contudo um filho de Deus entrou na cova e percorreu toda a sua extensão escura até a luz do dia e não encontrou o leão, somente outra abertura na cova que conduzia à luz do dia. E enquanto permanecia em suspenso, ouviu o leão atrás de si, não na frente.
- “Que farei?” disse. “Esta cova tem duas aberturas e enquanto eu entro por uma o leão sai pela que eu deixei atrás. Que farei? As armas não me servem. Como matar este leão e salvar o povo de seus dentes. Que farei?”.
Enquanto procurava um meio para fazer algo e escutava o rugido do leão, viu alguns montões de lenha e paus atirados em grande profusão, ao alcance de sua mão. Tirando do monte o que necessitava, arrastou-os com todas as suas forças e colocou um monte de paus e hastes com pequenas ramas secas dentro da abertura que estava próxima e as amontoou ali, bloqueando o caminho à luz do dia, para entrar e sair, fechando-se e encerrando o feroz leão dentro da cova. Então se voltou e encontrou o leão.
Com suas mãos, pega o leão, comprimindo-o com força, sufocando-o. Próximo de seu rosto sentia o aspirar e respirar do leão. Porém, com decisão, manteve sua garganta apertada e o estrangulou. Mais e mais débeis se tornaram os rugidos de ódio e temor; mais e mais débil se tornava o inimigo do homem; cada vez mais baixo se abatia o leão, porém Hércules o sustentava, asfixiando-o (tirando seu alento). E foi assim que ele matou o leão com suas duas mãos, sem suas armas e com sua própria e admirável força. Depois, retirou sua pele, mostrando-a para o povo que não podia entrar na cova. – “O leão está morto”, gritavam, “o leão está morto”.
Agora podemos viver e lavrar nossas terras e semear as sementes que necessitamos e andar em paz para sempre. O leão está morto e grande é o nosso libertador, o filho de homem que é um filho de Deus, chamado Hércules.
Assim Hércules retornou triunfante Àquele que o enviou para provar sua força, para servir e satisfazer a necessidade daqueles que se encontravam em horrível angústia. Ele colocou a pele de leão sob os pés do que era o Mestre de sua vida e obteve permissão para usar a pele no lugar da já gasta e usada.
- “A façanha está feita. O povo agora está livre. Não existe mais medo. O leão está morto. Com minhas próprias mãos eu estrangulei o leão e assim o matei.” - “De novo, ó Hércules, mataste um leão. Outra vez o estrangulaste. O leão e as serpentes devem ser mortas repetidas vezes. Bem fizeste, meu filho; vai e descansa em paz com aqueles que hás libertado do temor”.
O quinto trabalho terminou e eu vou relatá-lo ao Grande Presidente, que está esperando na Câmara do Concílio do Senhor. “Descansa em paz”.
E da Câmara do Concílio chegou uma voz: - “EU SOU”. “(BAILEY, 2008)
d)    Comentário:
No seu quinto trabalho, o iniciado realiza a quinta viagem iniciática e se torna a estrela de cinco pontas, o homem perfeito que domina a si mesmo. Para tanto, o iniciado precisa antes dominar seus instintos e demonstrar que tem poder sobre ela. O rugido do Leão é o apelo sexual que precisa ser dominado. Não morto, mas controlado, sufocado.
O leão que estava na Senda, bloqueando a passagem é uma frase simbólica, que deixa claro que, enquanto não dominar a libido, o homem estará impedido de realizar seu progresso na Senda.” (URBANO JR, 2012, p.461)
         O silêncio realizado por Hércules durante o câmbio remete à meditação necessária quando se deseja vencer a si mesmo, superando a libido em ação (os rugidos do leão). Enfrentar o Leão (a besta interior) é etapa necessária ao iniciado que depois enfrentará a Hidra de Lerna.
         A imagem do Leão sufocado remete a cena em que o iniciado, por meio da meditação, sufoca a libido (energia sexual descontrolada) que o impede de ser libertar de si mesmo. Vestir a pele do Leão tem relação com a morte dos instintos animais e domínio do campo emocional.
         Toda a violência é abdicada quando Hércules deixa para trás as armas e passa a se valer do intelecto (e da meditação) para capturar seu inimigo, o Leão. Arma nenhuma consegue ultrapassar o couro do Leão, da mesma forma que é difícil ao iniciado penetrar no íntimo das energias sexuais. A cova é o sepultamento das pulsões sexuais por meio dela, sem armas, Hércules conseguiu dominar a besta sufocando-a. É preciso visitar as profundezas de si mesmo (cova) para se encontrar com o Leão (a besta interior) e aí dominar ele.

e)     Ilustração:
Figura 6: Hércules sufocando o Leão

3.6           Sexto Trabalho: Virgem, apoderando-se do cinturão de Hipólita
a)     Sol em Virgem: de 22 de agosto até 21 de setembro.
b)    Significado: a preparação do discípulo, a primeira iniciação e a capacidade de servir.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   O Grande Presidente chamou o Mestre que vigiava Hércules.
- “A época se aproxima”, disse. “Como está se conduzindo o filho de homem que é um filho de Deus? Está novamente preparado para aventurar-se e provar sua têmpera com um adversário de uma classe diferente? Pode passar agora o sexto Grande Portal?” O Mestre respondeu – “Sim, ele está seguro de si mesmo; quando um novo mandato sair, ele voltará a trabalhar novamente; isto posso afirmar ao Grande Presidente dentro da Câmara do Concílio do Senhor”.
Então surgiu a ordem. – “Levanta-te, ó Hércules e atravessa o sexto Grande Portal”. Outra ordem surgiu ao mesmo tempo, não para Hércules, mas para aqueles que habitavam nas margens do grande mar. Eles ouviram e escutaram.
Nessas margens habitava a Grande Rainha, que reinava sobre todas as mulheres do mundo então conhecido. Estas eram suas vassalas e, ao mesmo tempo, seus ousados guerreiros. Dentro de seu reino não se encontrava nenhum homem.
Só as mulheres se reuniam em volta de sua rainha. Professavam diariamente seu culto dentro do Templo da Lua e ali elas faziam sacrifícios a Marte, o deus da guerra. Por esta época vinham de regresso de sua visita anual a terra dos homens.
Dentro dos recintos do Templo elas esperavam a ordem de Hipólita, a rainha, que estava parada sobre os degraus do Altar Maior, levando o cinturão que Vênus, a rainha do amor, lhe dera. Esse cinturão era um símbolo, um símbolo da unidade conquistada através da luta, do conflito, da contenda; um símbolo da maternidade e da Criança Sagrada, para quem toda vida humana realmente se volta.
- “Chegou a noticia”, disse ela, “que por seu caminho vem um guerreiro cujo nome é Hércules, um filho de homem e, não obstante, um filho de Deus; a ele devo entregar este cinturão que uso. – “Obedecerei a ordem, ó Amazonas, ou combateremos a palavra de Deus?
Enquanto elas escutavam suas palavras e enquanto refletiam acerca do problema, novamente surgiu uma voz, informando que ele já estava presente, esperando sim apoderar-se do sagrado cinturão da aguerrida rainha.
A Rainha das Amazonas se apresenta diante de Hércules e este lhe dá combate sem escutar as belas palavras que esta se esforçava por dizer. Ele arranca o cinturão oferecido em obséquio como símbolo de unidade e amor, de sacrifício e de fé e mata Hipólita, que estava disposta a lhe entregar prazerosamente o cinto.
Estarrecido e horrorizado do que havia feito, Hércules permanecia ao lado da rainha agonizante, e ouviu uma voz dizer:
- “Meu filho, Por que matar o que necessitamos, está próximo e é querido? Por que matar a quem amas, a doadora de dignos presentes, custódia do possível? Por que matar a mãe do Menino Sagrado? Outra vez te advertimos do fracasso. Outra vez não entendeste. Redime-te agora mesmo e busca outra vez meu rosto”.
Fez-se silêncio e Hércules, levando o cinturão sobre seu peito, buscou o caminho de volta, deixando às mulheres lamentando-se, privadas de direção e de amor.
Hércules foi novamente para as costas do grande mar e, próximo à costa rochosa viu um monstro do abismo sustentando entre suas mandíbulas a pobre Hesíone. Seus gritos e lamentos se elevavam ao alto e feriam os ouvidos de Hércules, entregue a compaixão e sem conhecer o caminho que pisava.
Sem hesitar, ele se lançou prontamente em sua ajuda, porém demasiado tarde.
Ela havia desaparecido dentro da garganta cavernosa da serpente marinha.
Porém, esquecendo de si mesmo, Hércules afastou resolutamente as ondas e alcançou o monstro, que voltando-se para ele com rápido ataque e forte rugido, abriu sua imensa boca. Hércules se lança pela mesma em busca de Hesíone, arrebata-a e enquanto a sustentava com a mão esquerda, com a espada abria caminho desde o ventre da serpente até a luz do dia. E assim a resgatou, compensando, desta forma, seu prévio ato de morte. Pois assim é a vida: um ato de morte, um ato de vida e assim, os filhos dos homens, que são filhos de Deus aprendem a sabedoria, o equilíbrio e a Senda para caminhar com Deus.
Da Câmara do Concílio do Senhor, o Grande Presidente era espectador de tudo. De seu posto ao seu lado, o Mestre também contemplava.
Hércules retornou passando novamente o Sexto Portal. Vendo isto e vendo o cinturão e a donzela (Hesione), o Mestre disse:
- “O sexto trabalho está terminado. Mataste a quem te estimava e todo o desconhecido e o não reconhecido que te dava o necessário amor e poder. Resgataste a quem te necessitava, e assim de novo os dois são um.
Reflete outra vez sobre os caminhos da vida refletindo-se nos caminhos da morte. Vai e descansa, meu filho”. “ (BAILEY, 2008)

d)    Comentário:
Este trabalho aponta para as três virtudes principais no signo de Virgem, que são a tolerância, a compaixão e a caridade. A falha de Hércules na tolerância (da diferença do outro ao matar Hipólita) foi seguida da vitória dele na compaixão e na caridade (ao redimir-se salvando Hesíone).
O guerreiro abriu mão da amizade da guerreira Hipólita, e assim do seu lado feminino, o qual foi resgatado após o aprendizado obtido com Hesíone. O cinturão representa justamente a energia feminina, aquela que o iniciado deverá saber fazer bom uso.
A verdadeira tolerância não significaria apenas um local de concordância ou simples aceitação da diferença do outro, expressa por um comportamento condescendente de superioridade. A tolerância significa antes o desejo de estar próximo do outro, da diferença do outro, neste caso do aspecto feminino.
A tolerância se demonstra importante virtude para equilibrar a dialética entre os interesses pessoais (levar o cinto a Eristeu, ou sua filha)  e os sociais (aceitar a amizade de Hipólita), que se demonstra por meio do ato de servir.

e)     Ilustração:
                                      Figura 7: O cinto de Hipólita
3.7           Sétimo Trabalho: Libra, captura do javali de Erimanto
a)     Sol em Libra: de 22 de setembro até 21 de outubro.
b)    Significado: Aquisição e integração do equilíbrio dos opostos. A segunda iniciação.     
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   (...)“Sai, me filho, e captura o javali; salva uma região assolada, porém toma o tempo de alimentar-te”.
Apolo vem e lhe oferece um arco chamejante para usar. Diz Hércules: - “Não o levarei comigo no caminho por temor de matar. Em meu último trabalho, nas margens do grande mar, eu matei e destruí. Desta vez eu não matarei. Eu abdico do arco.
Desarmado, exceto por sua forte clava, subiu a montanha, procurando o javali, vendo a cada lado, visões de medo e terror. Subiu ainda mais e mais alto. Então se encontrou com um amigo, Folo, um de um grupo de centauros, conhecido dos deuses. Eles se detiveram e conversaram e, por um momento, Hércules esqueceu o objeto de sua busca. E Folo chamou a Hércules, convidando-o a abrir um tonel de vinho, que não era seu, nem tampouco pertencia a Folo. Este grande barril pertencia ao grupo de centauros; dos deuses, que os haviam beneficiado com o tonel, havia vindo a ordem de que nunca deveria ser aberto, salvo quando todos os centauros se encontrassem e estivessem presentes. O tonel pertencia ao grupo.
Porém Hércules e Folo o abriram na ausência de seus irmãos, chamando a Quíron, outro centauro sábio, para que fosse e compartilhasse da bebedeira. Este assim o fez e os três beberam juntos e se deleitaram e se embriagaram e fizeram muita farra. O alarido foi ouvido pelos outros centauros onde se encontravam.
Eles acudiram encolerizados e uma feroz batalha teve lugar e apesar das sábias resoluções, novamente o filho do homem se transformou no mensageiro da morte e matou a seus amigos, os dois centauros com os quais antes havia bebido. E enquanto os outros centauros se afligiam com fortes lamentações, Hércules escapou outra vez para as altas montanhas e novamente reassumiu sua busca.
Ele foi até os limites da neve, seguindo as pegadas do feroz javali; seguiu-o até as alturas e o áspero frio e, contudo, não o viu. A noite se aproximou e as estrelas começaram a sair e ainda não tinha pista do javali.
Procurou dentro de si mesmo alguma destreza ou malícia sutil. Colocou então, uma armadilha com habilidade e sabiamente oculta e esperou numa sombra escura a chegada do javali. As horas passaram e ele esperou até o alvorecer.
O javali saiu de sua guarida buscando comida, impulsado por uma fome de dias. Nas sombras, próximo da armadilha, Hércules o esperava. O javali caiu dentro da armadilha e em seu devido tempo Hércules livrou-o, fazendo-o prisioneiro de sua habilidade. Lutou com o javali e o dominou, obrigando-o a fazer o que ele dizia e seguir o caminho que desejava.
Hércules desceu feliz do alto da montanha, conduzindo diante de si, pela senda que baixava, o feroz, porém domesticado, javali. Pelas patas traseiras, ele conduzia o javali e todos na montanha riam ao ver a cena. Todos os que o encontravam no caminho, cantando e bailando, riam também ao ver a marcha dos dois. E todos dentro da cidade riam ao ver a mesma cena: o cambaleante e cansado javali e o homem que ria e cantava.
Assim executou Hércules seu sétimo trabalho e regressou para o Mestre de sua Vida.
E o Grande Presidente dentro da Câmara do Concilio do Senhor observou: “A lição do verdadeiro equilíbrio foi aprendida. Ainda falta uma lição.
De novo, no nono Portal, o centauro deve ser encontrado e conhecido e retamente compreendido”.
E o Mestre disse: O sétimo trabalho está completado, o sétimo Portal foi ultrapassado. Considera as lições do passado; reflete sobre as provas meu filho.
Duas vezes mataste o que deverias amar. Aprende o por quê.” (BAILEY, 2008

d)    Comentário:
O aprendizado deste trabalho recupera aprendizados anteriores (especialmente aqueles utilizados na captura do Leão). O correto uso do pensamento (e da meditação) facilita na realização das tarefas, o que fica evidente pela captura do javali ter ocorrido sem emprego de força física, o atributo mais conhecido de Hércules. A capacidade de lidar com adversidades e inclusive improvisar é um dos aprendizados deste trabalho, demonstrada quando Hércules desce a ladeira tomando o javali por suas patas traseiras.Esta descida estranha da ladeira simboliza a alma dirigindo o corpo rude, em equilíbrio para que nenhum dos dois tombe na íngreme caminhada que sempre é a busca da verdade:“A Busca da verdade, então, transforma-se no desenvolvimento do discernimento. Em um sentido, a verdade não existe para os seres humanos, pois todas as verdades não são senão partes fracionárias de conjuntos maiores.” (URBANO JR, 2012, p.468)
Neste trabalho, uma segunda iniciação, Hércules abdica das armas que utilizou no trabalho anterior e que o levaram assassinar sua tolerância e realiza sua tarefa sem esforço físico ou violência, demonstrando ter assimilado o aprendizado do equilíbrio ao conseguir capturar sem matar.
O javali é o símbolo das emoções descontroladas e o uso da vontade é a ferramenta para disciplinar tais emoções.        O equilíbrio evocado pela balança de Virgem aponta no sentido da busca do equilíbrio interior entre os aspectos emocionais (animais) e os espirituais (razão).
    
Ilustração:

Figura 8: Hércules e o Javali do Erimanto, estátua em bronze de Louis Tuaillon (1904), Berlin.[8]
3.8           Oitavo Trabalho: Escorpião, destruindo a Hidra de Lerna
a)     Sol em Escorpião: de 23 de outubro até 22 de novembro.
b)    Significado: Controle e superação dos desejos: a maior prova.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   ...)“A Luz agora brilha no oitavo Portal”, disse o Mestre. - “No antigo reino de Argos houve uma seca. Amimona suplicou a ajuda de Netuno e este lhe ordenou que golpeasse uma roca e, quando ela o fez, brotaram três correntes cristalinas; porém prontamente uma hidra fez ali sua morada. Ao lado do Rio Amimona, está o infecto pântano de Lerna. Dentro desta fétida lama jaz a monstruosa hidra, uma calamidade para a comarca. Esta criatura tem nove cabeças e uma delas é imortal. Prepara-te para combater com esta repugnante besta. Não penses que podem servir-te meios comuns; destrói uma cabeça, duas crescem aceleradamente.”
Hércules aguardava com expectação.
O Mestre voltou a falar: - “Eu só posso dar uma palavra de conselho:
“Ascendemos ajoelhando-nos; vencemos cedendo, ganhamos renunciando. Vai ó filho de Deus e filho de homem e vence!”. Então Hércules ultrapassou o oitavo Portal.
As águas estancadas do pântano de Lerna era uma mancha que desalentava a todos que chegavam a seus confins. Seu mau cheiro contaminava toda a atmosfera num espaço de 10 quilômetros. Quando Hércules se aproximou teve que deter-se, pois só o mau cheiro quase o venceu. A lodosa areia movediça era um perigo e mais de uma vez rapidamente retirou seu pé, temendo que fosse sugado pela terra frouxa.
Finalmente encontrou a toca onde morava a monstruosa besta.
Dentro de uma caverna onde reinava perpétua noite, a hidra estava oculta. De dia e de noite Hércules rondava o traiçoeiro pântano, esperando o momento propício em que a besta saísse. Ele vigiava em vão. O monstro permanecia dentro de seu fétido lamaçal.
Recorrendo a um estratagema, Hércules submergiu suas flechas em breu ardente e as fez chover diretamente dentro da horrível caverna onde morava a bocejante besta. Uma agitação e comoção imediatamente sobrevieram.
A hidra emergiu com suas nove encolerizadas cabeças exalando chamas. Sua escamosa cola açoitava furiosamente a água e a lama salpicou a Hércules. O monstro levantou-se a altura de três braças (6,6m); sua fealdade permitia que se pensasse que foi feito com todos os mais impuros pensamentos concebidos desde que começou o tempo. A hidra se lançou sobre Hércules e procurou enrolar-se ao redor de seus pés. Ele se afastou e lhe assestou um golpe tão demolidor que uma de suas cabeças foi imediatamente separada. Apenas havia esta horrível cabeça caído dentro do pântano, duas cresceram em seu lugar. Uma e outra vez Hércules atacou o furioso monstro, porém este a cada assalto se tornava mais forte.
Então Hércules se lembrou que seu Mestre havia dito: “nos elevamos ajoelhando-nos”. Jogando para um lado seu garrote, Hércules se ajoelhou, agarrou a hidra com suas mãos desnudas e levantou-a no ar. Suspensa no meio do ar, sua força diminuiu. De joelhos, então, ele sustentou a hidra, no alto, por cima dele, para que o ar e a luz purificadora pudessem ter seu esperado efeito. O monstro forte na escuridão e no pantanoso barro, rapidamente perdeu seu poder quando os raios do sol e o contato do vento caíram sobre ele.
Esforçou-se convulsivamente, passando um estremecimento através de sua repugnante figura. Cada vez mais desfalecida se fez sua luta até que foi vencida. As nove cabeças se inclinaram. Logo arquejantes bocas e olhos vidrados caíram frouxamente para diante. Porém só quando elas jazeram totalmente sem vida Hércules percebeu a mística cabeça imortal.
Então Hércules cortou a cabeça imortal da hidra e, embora esta estivesse ainda silvando ferozmente, a enterrou debaixo de uma rocha.
Retornando, Hércules parou diante de seu Mestre. “A vitória foi conquistada” disse o Mestre. “A luz que brilha no oitavo Portal está agora misturada com tua própria luz”. “ (BAILEY, 2008)

d)    Comentário:
A bela alegoria das cabeças que surgem sempre que uma é cortada remete à gênese dos pensamentos e desejos: quando o iniciado se livra de um, outros aparecem. Neste sentido, o iniciado precisa ter extrema paciência para inventariar os pensamentos e desejos que surgem a todo momento (inclusive os que se colocam mais ocultos) a fim de, ao polir sua personalidade, manter os mais elevados.
Está luta contra os pensamentos e emoções que se multiplicam só prosperará quando o iniciado se elevar aos pensamentos mais superiores. Da mesma forma que Hércules precisou sair do lamaçal e elevar a Hidra para combate-la, o iniciado precisa primeiro se preocupar em elevar seus pensamentos para então vencer o aspecto mais viciado de sua personalidade. Superar a si mesmo passa  não necessariamente por matar os pensamentos ruins, mas se elevar em direção aos bons.
Da mesma forma que a uma das cabeças da Hidra mitológica era imortal, há uma série de pensamentos e emoções que simplesmente não podem ser extirpadas pois são constitutivas do indivíduo e responsáveis pelo caminho que levou o iniciado até o momento atual. Mais um motivo para se crer que a libertação passa mais pelo controle do que pelo extermínio dos vícios.
Tal exercício de controle passa invariavelmente pela necessidade do homem se colocar humilde diante da força que os vícios tem em sua vida, da mesma forma que Hércules fez ao se ajoelhar na lama.
Simbolicamente, segundo Urbano Jr. (2012, p. 473-474) pode-se deduzir a dimensão simbólica das cabeças da Hidra:
“(...) 7. Três das cabeças da hidra estão associadas com: Desejo (Sexo), Comodidade e Dinheiro.
8. O segundo grupo de três correspondem ao Temor, Ódio e o Desejo de Poder.
9. As três últimas correspondem aos vícios da mente não iluminada, ou seja: Orgulho, Separatividade e Crueldade.
10. As três virtudes que Hércules tinha de expressar eram: humildade, coragem e discernimento. Humildade para reconhecer seus defeitos e o problema a ser enfrentado: coragem para atacar o monstro que permanece enroscado nas raízes de sua natureza e discernimento para descobrir a técnica para possuí-las no encontro com seu mortal inimigo. ” (URBANO JR, 2012, p.473-474)

         Assim, pode-se deduzir que as cabeças simbolizavam os nove vícios capitais e, tal qual afirmava Sócrates, o exercício da virtude é a eterna vigilância do vício.
e)     Ilustração:

Figura 9: Hércules e a Hidra de Lerna

3.9           Nono Trabalho: Sagitário, afugentando as aves de Estínfale (ou a morte das aves)
a)     Sol em Sagitário: de 23 de novembro até 22 de dezembro.
b)    Significado: Acabar com as tendências do uso do pensamento destrutivo.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   Dentro do lugar de paz permanecia o Mestre e falou para Hércules: - “Ó filho de Deus que sois também um filho de homem. Chegou a hora de pisar outro caminho. Achas-te diante do nono Portal. Passa por ele e dirige-te ao pântano de Estínfale, onde moram os pássaros que fazem estragos. Descobre depois o meio para fazê-los voar de sua segura morada por muito tempo. “A Chama que brilha além da mente revela a direção segura”, acrescentou. A tarefa aguarda. Deves passar agora através do nono Portal.”
Hércules procurou durante muito tempo até que chegou a Estínfale.
Ante ele se estendia fétido pântano. Uma multidão de pássaros grasnavam roucamente, de forma ameaçadora e dissonante à medida que ele se aproximava.
Olhando de mais perto viu os pássaros. Eram grandes, ferozes e horríveis. Tinham bicos de ferro, afiados como uma espada. As penas também, como dardos de aço, se caíssem, podiam partir em dois a cabeça dos fatigados viajantes. Suas garras se igualavam a seus bicos em agudeza e força.
Três pássaros, percebendo a presença de Hércules, se precipitaram sobre ele. Ele, entretanto, manteve-se em seu lugar e aparou os ataques com a pesada clava que sustentava. Golpeou as costas de um dos pássaros de forma ressoante e duas penas caíram verticalmente ao solo e tremularam enquanto afundavam na terra frouxa. Finalmente os pássaros se retiraram. Hércules permanecia diante do pântano e refletia em como poderia realizar a tarefa que lhe foi deferida, ou seja, como livrar o lugar destas aves de rapina. Procurou muitos meios para encontrar uma maneira de consegui-lo. No princípio tentou matá-las com seu arco e o carcás cheio de flechas. As poucas que matou não eram senão uma fração das muitas que ficavam. Elevavam-se em nuvens tão espessas que ocultavam o sol.
Pensou em colocar armadilhas dentro do pântano, porém nem barca nem pés humanos podiam atravessar o lamaçal.
Hércules meditou e lembrou então das palavras de conselho que seu Mestre lhe havia dado. Refletindo por um longo tempo se lhe ocorreu um método, pois lembrou que tinha dois grandes címbalos de bronze, presentes da Deusa Atenéia, que emitiam um agudo sobrenatural; um som tão penetrante e tão desagradável que podia assustar os mortos. Para o próprio Hércules o som era intolerável que teve de tampar os ouvidos com duas almofadas, tal o desconforto que sentiu.
Na hora do crepúsculo, quando o pântano estava repleto de inumeráveis pássaros, Hércules golpeou os pratos dos címbalos com vigor várias vezes e um estrondo estridente sobreveio que até ele mesmo apenas podia suportá-lo. Tal dissonância jamais tinha sido ouvida em Estínfale.
Aturdidas e perturbadas por tão monstruoso ruído, as aves se elevaram no ar com as asas de bronze batendo selvagemente e chilrando com ronco desalentado. Completamente perturbada, a vasta nuvem de pássaros fugiu com pressa frenética, para nunca mais regressar. O silêncio se difundiu através do pântano. As aves horríveis tinham desaparecido.
Quando Hércules regressou, o Mestre lhe saudou: As aves de rapina foram afugentadas. O trabalho está cumprido. “(BAILEY, 2008)

d)    Comentário:
Se em Áries Hércules não zela pelo trabalho ao permitir que seu amigo conduza as éguas, irresponsabilidade que matou Abderis, em Sagitário Hércules assume integralmente o trabalho, utilizando-se de todos os aprendizados anteriores, deste a observação, a criatividade, a vontade e, por fim, a intuição.
As três aves que lhe atacam representam alegoricamente, segundo Urbano Jr (2012, p.475) a “murmuração, (a reclamação de não ser compreendido pelos outros), conversação deletéria (ou seja, o cuidado com a palavra proferida) e intolerância em relação às verdades alheias, ou seja, a prática da minha opinião é que deve prevalecer.”
As aves representam os pensamentos equivocados que perturbam a caminhada do iniciado na senda evolutiva.  É preciso “afugentar” tais pensamentos do lamaçal que são os vícios da personalidade.
Uma versão alternativa da mesma história fala que as aves que possuíam bicos, penas e garras de bronze (metal inferior) foram afugentadas quando Hércules sacodiu os chocalhos de ouro (metal superior, no sentido alquímico) que recebera de Hermes.
O som que vem do ouro é o aviso da sabedoria, do pensamento intuitivo, enfim, dos pensamentos superiores que tem a capacidade de “afugentarem” todo tipo de pensamentos inferiores (as aves com partes em bronze). Escutar o som áureo é escutar o interior do ser.
A capacidade intuitiva evocada em Sagitário também mantém relação com o pensamento abstrato, tão importante para o estudo iniciativo às crenças filosóficas e religiosas. As aves gigantes que ofuscavam o sol são as crenças dogmáticas que precisam ser afugentadas para que a verdadeira luz da sabedoria possa iluminar o iniciado acabando com as tendências do uso do pensamento destrutivo.
e)     Ilustração:

Figura 10: Hércules e as aves, tapeçaria do século XVI
3.10      Décimo Trabalho: Capricórnio, matando o Cérbero
a)     Sol em Capricórnio: de 23 de dezembro até 20 de janeiro.
b)    Significado: Elevação da personalidade. A terceira iniciação.
c)     História, segundo Bailey (2008):
“   (...)“Mil perigos desafiastes, ó Hércules e muito conquistastes. A força e a Sabedoria são tuas. Farás uso delas para resgatar o que agora é vítima de uma enorme injustiça e persistente sofrimento?”
O mestre toca suavemente a fronte de Hércules. Ante o olho interior, deste, surgiu a visão de um homem encerrado em lugar infecto e assolado por milhares de criaturas demoníacas. Alçava suas mãos contritas e gritava pedindo ajuda, porém suas palavras retumbavam vãmente na desolação e eram tragadas pelo vento. A visão desapareceu. Hércules permanecia como antes ao lado de seu guia.
O prisioneiro que viste se chama Teseu, disse o Mestre. Por anos tem sofrido assim por ter tentado, com a ajuda de seu amigo Piritoo (O Cristo), arrebatar Perséfone (a Alma), a companheira de Hades, o Senhor das profundezas. Descoberto, permanece manietado sob grandes sofrimentos.
Havendo ouvido e compreendido, Hércules se lançou nesta busca e passou através do décimo Portal.
Para baixo, sempre para baixo, ele viajou dentro dos apertados mundos da forma. A atmosfera se havia tornado sufocante e fétida; a escuridão cada vez mais intensa e, contudo, sua vontade era firme. A inclinada descida continuou durante muito tempo, somente que a partir de certo tempo começou a sentir outras presenças ao seu lado e, procurando, ouviu a voz prateada da deusa da Sabedoria Atenéia e as palavras fortalecedoras de Hermes-Mercúrio.
Finalmente chegou a esse escuro e envenenado rio chamado Estige, o rio que deve ser cruzado pelas almas dos mortos. Um óbolo ou moeda precisava ser pago a Caronte, o barqueiro, para que conduza as Almas, à outra margem, ou seja, para a terra sem volta. O sombrio visitante da Terra assustou a Caronte que, esquecendo sua paga, conduziu o estrangeiro ao outro lado.
Hércules entrou por fim no Hades, uma escura e brumosa região onde as sombras dos mortos deslizavam por ali.
Através de negros labirintos fez seu caminho até que chegou a sala do rei que governava o mundo subterrâneo: Hades. Este, soturno e severo, com semblante ameaçador, estava sentado em seu negro trono de azeviche, enquanto Hércules se aproximava.
Que buscas tu, um mortal vivente em meus domínios? Perguntou Hades. Hércules respondeu: “Busco libertar Teseu”.
- O caminho está vigiado pelo monstro Cérbero, um cachorro com três grandes cabeças, cada uma das quais tem serpentes enroscadas ao seu redor, replicou Hades. Se tu podes vencê-lo com tuas mãos desnudas, uma façanha que ninguém ainda realizou, podes levar Teseu. Satisfeito com esta resposta, Hércules prosseguiu. Imediatamente viu o cão de três cabeças e ouviu seu penetrante latido. Grunhindo, este saltou sobre Hércules.
Agarrando primeiro a garganta de Cérbero, Hércules a apertou com seu punho de aço, como num torno. Atingido até a fúria frenética, o monstro se sacudiu. Finalmente, ao apaziguar-se sua força, Hércules o dominou.
Feito isto, Hércules prosseguiu e encontrou Teseu em agonizante dor. Então, Hércules rompeu rapidamente suas cadeias e libertou o prisioneiro.
Apressando seus passos, Hércules regressou como havia vindo. Quando alcançou mais uma vez o mundo das formas viventes, encontrou ali a seu Mestre.
“A luz agora brilha dentro da escuridão” disse o Mestre. Descansa agora meu filho.  “(BAILEY, 2008)

d)    Comentário:
Por mais que a história não detalhe, fica claro que antes de iniciar o trabalho em Capricórnio, Hércules passou pelo processo de purificação a fim de provar que havia vencido o seu próprio ímpeto.
As três cabeças do cão simbolizam, segundo Urbano Jr (2012, p.478) “a sensação, o desejo e as boas intenções”.
         A avalanche de sensações do mundo pode ocupar a mente e a capacidade de discernimento daqueles que, mesmo iniciados, vivem adormecidos de si mesmos. A sensação, segundo Urbano Jr. (2012, p.478) é a “vontade que deseja se expressar e, assim obter satisfação no mundo exterior”.  É preciso vigiar as sensações.
         A principal “cabeça” é a do desejo, que é a força motriz de todas as demais cabeças, de todas as vontades. Impossível é vigiar o desejo, mas importante é observa-lo e conhece-lo.
         O desejo, diante de um mundo repleto de sensações, pode caminhar ao lado da terceira cabeça (a das boas intenções).  A terceira cabeça aí simboliza um tipo especial de boa intenção: aquela que não é levada a termo. Esta intencionalidade vazia, ainda que boa, não possui efeito prático na senda evolutiva do iniciado. Por isso, merece a atenção para que não ocupe o caminhar daquele.
         As serpentes na cauda se referem às ilusões do mundo material, que aprisionam o homem em uma série de atividades que sugam a energia psíquica do iniciado e o afastam de pensamentos mais elevados.
          A libertação de Teseu simboliza a terceira iniciação de Hércules, agora voltado por fazer feliz a humanidade e colocado em posição de servir ao outro. Teseu é a inteligência humana, liberta por Hércules de tudo que simboliza o cão Cérbero.  Para libertar Teseu, Hércules precisa visitar os mundos inferiores onde a inteligência humana está aprisionada.
         Ao finalizar sua missão de libertação, Hércules ouve de seu mestre que “a luz agora brilha na escuridão”. Pela terceira iniciação Hércules não apenas recebeu a luz (simbolizada pelo aprendizado em todos os demais trabalhos anteriores) mas também se torna um verdadeiro portador da luz, levando-a aos mundos inferiores a fim de liberar a inteligência humana.  Hércules está elevado.
         Uma variante da mesma história concebe que Cérbero (nome que significa demônio do poço) era sinônimo da própria morte por guarnecer o caminho ao Hades (inferno). Capturar ou transpor Cérbero seria superar a morte. Quem passava pelo cão jamais voltava. As três cabeças serviriam para julgar aquele que entrava no mundo dos mortos: uma para julgar sua beleza, outra sua nobreza e a terceira a sua bondade. Cérbero admirado por encontrar em Hércules as três graças tornou-se frágil de modo que o herói o captura e leva ao rei Eristeu. Este mesmo Cérbero, segundo tal variante, ao cruzar-se com uma Quimera, foi o pai do Leão de Nemeia e ainda da Esfinge derrotada por Édipo.
e)     Ilustração:
Figura 11: Hércules e o cão de três cabeças Cérbero

3.11      Décimo Primeiro Trabalho: Aquário, limpando os estábulos de Áugias
a)     Sol em Aquário: de 21 de janeiro até 19 de fevereiro.
b)    Significado: O serviço de limpeza e purificação, com uso da água, preparando o encerramento do ciclo.
c)     História, segundo Bailey (2008):

“   O Mestre para Hércules:
“Onze vezes girou a roda e agora tu estás diante de outro Portal.
Volta sobre teus passos; regressa para aqueles para quem a luz não é senão um ponto transitório e, ajuda-os a fazê-la crescer. Dirige teus passos para Augias, cujo reino deve ser purificado de antigos males.”
Saiu Hércules pelo décimo primeiro portal em busca do Rei Augias.
Quando Hércules se aproximou do reino onde Augias era o soberano, sentiu um horrível mau cheiro que o debilitou e quase o fez desfalecer. Tomou conhecimento de que, por anos, o Rei Augias não havia tirado nunca o esterco que seu gado deixava dentro dos estábulos reais.
Também as pradarias estavam cheias de esterco, impedindo que nenhuma semeadura pudesse crescer. Em consequência, uma abrasante pestilência estava percorrendo toda a região, fazendo estragos junto aos súditos do reino.
Hércules então dirigiu-se ao palácio e procurou Augias. Informado de que Hércules limparia os hediondos estábulos, Augias demonstrou desconfiança e incredulidade.
Dizes que farás este enorme labor sem recompensa? Manifestou suspicazmente o rei. “Não tenho fé naqueles que fazem tais alardes. Algum arteiro plano hás tramado, Ó Hércules, para despojar-me do trono. Nunca ouvi nada de homens que buscam servir ao mundo sem uma recompensa. Neste momento, contudo, daria as boas-vindas a qualquer néscio que buscasse ajudar. Porém devemos fechar um trato, a fim de que não seja repreendido como um rei tonto. Se tu, em um só dia, fizeres o que prometes, uma décima parte de meu grande rebanho será teu; porém se fracassas, tu vida e sorte estarão em minhas mãos. Naturalmente eu não penso que tu possas cumprir tua bravata, porém, procura fazê-lo como possas.”
Hércules saiu da presença do Rei. Andou pelo assolado lugar e viu uma carreta carregada com cadáveres apinhados, vítimas da pestilência.
Observou que dois rios, o Alfeu e o Peneo corriam tranquilamente próximo dali. Sentado nas barrancas de um deles, a resposta de seu problema surgiu relampagueante em sua mente.
Foi para as estrebarias e primeiro destruiu o muro que rodeava os estábulos; depois fez dois grandes buracos em seus lados opostos e, com grandes esforços conseguiu desviar ambas correntes do curso que haviam seguido durante décadas. O Alfeu e o Peneo verteram suas águas através dos estábulos do Rei Augias, cheios de esterco. As impetuosas correntes varreram a imundícia acumulada durante 30 anos. O reino foi purificado de toda a sua fétida escuridão. Num único dia, Hércules havia realizado a tarefa impossível e, completamente satisfeito com este resultado, regressou para onde estava Augias. Este, ao vê-lo, franziu o cenho. “Tu tiveste êxito por meio de um ardil”, gritou o Rei, cheio de ira. “Os rios fizeram o trabalho, não tu. Foi uma artimanha para apoderar-te de meu gado; uma conspiração contra meu trono. Não terás recompensas. Vai-te, retira-te daqui antes que rebaixe tua estatura numa cabeça.
Assim, o encolerizado rei desterrou Hércules, e lhe disse que nunca mais pusesse os pés em seu reino sob pena de uma morte súbita.
Tendo realizado a tarefa que lhe foi assinalada, Hércules voltou àquele de quem havia vindo.
“Te tornaste um servidor do mundo”, disse o Mestre quando Hércules se aproximou. “Progrediste retrocedendo; chegaste a Casa da Luz por outro caminho; tu empregaste tua luz para que possa brilhar a luz dos outros. A joia que outorga o undécimo trabalho é tua para sempre”. “ (BAILEY, 2008)

d)    Comentário:
A Era de Aquário é marcada por um “derrubar de muros”, justamente o que Hércules fez ao derrubar as barreiras que envolviam os estábulos. Esta tendência “libertária” da Era de Aquário é expressa nas relações sociais, políticas e econômicas na atualidade.
Se ao libertar Teseu pode-se afirmar que Hércules se colocava como herói-salvador de um homem, ou de uma característica humana (a inteligência), agora ao limpar as estrebarias ele se coloca como “Mestre Servidor da espécie raça”, nas palavras de Urbano Jr (2012, p.480).
Hércules se purifica ao purificar o mundo, direcionando o fluxo de limpeza e purificação de suas energias sexuais. Hércules, purificado em Aquário é Mestre porque aprendeu a servir e aprendeu a servir porque se tornou Mestre.  Neste sentido, contribuir Urbano Jr (2012, p.481):
“Serviço desinteressado – Este não é o serviço que prestamos porque alguém nos diz que o serviço prestado é um caminho para nossa libertação espiritual, mas o serviço que prestamos porque nossa consciência não é mais autojcentrada e temos a convicção de que precisamos ajudar nossos semelhantes. Não estamos mais interessados em nós mesmos, já que nossa consciência tornando-se universal começa a assimilar as aflições de nosso próximo e então passamos a ajudá-lo porque passamos a ter a consciência de que ele faz parte de nós. Não é nenhum esforço para o Mestre Aquariano proceder assim.” (URBANO JR, 2012, p.481)

         Ao descer do alto da montanha em Capricórnio para limpar os estábulos Hércules demonstra o auto sacrifício necessário para a purificação interior.
         Importante mencionar que na Grécia antiga era hábito os gregos tomarem três banhos diários, pois a cultura acreditava que a água era purificadora não apenas do corpo, mas do espírito. Limpar os estábulos é uma alegoria à purificação de si mesmo.
         O iniciado em Aquário tem o compromisso altruísta de concorrer à salvação da humanidade, influenciando-a positivamente com suas atitudes purificadoras.
         Este trabalho de Hércules simboliza a capacidade de se transcender os interesses pessoais e trabalhar em prol do bem comum, seguindo o grande plano universal da vida (a senda iniciática).
e)     Ilustração:
Figura 12: Os Estábulos do Rei Áugias
3.12      Décimo Segundo Trabalho: Peixes, a captura da manada colorida de Gerion ou a captura do gado vermelho de Gerião
f)      Sol em Peixes: de 20 de fevereiro até 21 de março.
g)     Significado: A transcendência da animalidade, a salvação.
h)    História, segundo Bailey (2008):
“   O Mestre, para Hércules:
“Estás agora diante do último portal. Resta fazer ainda um trabalho antes que o círculo se complete e seja alcançada a libertação. Marcha para esse tenebroso lugar chamado Eritréia, onde a Grande Ilusão está entronizada; onde Gerion (o Inimigo Secreto), o monstro de três cabeças, três corpos e seis mãos, é o Senhor e Rei. Ilegalmente ele retém uma manada de Bois vermelhos. Desde Eritréia até nossa Cidade Sagrada tu deves conduzir esta manada. Cuidado com Eurition, o pastor e seu cachorro de duas cabeças, Ortro”. Fez uma pausa. “Posso fazer-te uma advertência”, agregou lentamente. “Invoca a ajuda de Hélios”.
O filho de homem que era também filho de Deus partiu através do duodécimo portal. Ele ia à busca de Gerion.
Dentro de um templo, Hércules fez oferendas a Hélios, o deus do fogo no Sol. Meditou durante sete dias e então lhe foi concedido um favor. Um cálice de ouro caiu ao solo ante seus pés. Ele soube dentro de si mesmo que este brilhante objeto lhe permitiria cruzar os mares para chegar à região da Eritréia.
E assim foi. Dentro da segura proteção do cálice de ouro, ele navegou através de agitados mares até que chegou a Eritréia. Hércules desembarcou numa praia do longínquo país. Não muito depois chegou à pradaria onde a vermelha manada pastava. Esta estava cuidada pelo pastor Eurition e por Ortro, o cachorro de duas cabeças.
Quando Hércules se aproximou, o cachorro veio veloz como uma flecha para seu alvo. O animal se lançou sobre o visitante, grunhindo malignamente, dando ferozes dentadas com seus caninos a descoberto. Com um golpe decisivo, Hércules derrubou o monstro.
Então Eurition, temeroso do bravo guerreiro que estava diante dele, suplicou que lhe perdoasse a vida. Hércules lhe atendeu o rogo.
Conduzindo a manada vermelha adiante de si, Hércules voltou seu rosto para a Cidade Santa.
Não havia ido muito longe quando percebeu uma nuvem de pó distante que rapidamente aumentava de tamanho. Supondo que o monstro Gerion vinha em furiosa perseguição, se voltou para enfrentar o inimigo. Pronto Gerion e Hércules estavam frente a frente. Soprando fogo e chamas por suas três cabeças ao mesmo tempo, o monstro se encontrou com ele. Gerion arrojou uma lança sobre Hércules que quase atingiu o alvo. Colocando-se agilmente para um lado, Hércules esquivou o dardo mortal.
Estendendo seu arco, Hércules disparou uma flecha que parecia incendiar o ar quando a soltou, e golpeou o monstro de cheio em suas costas.
Com tão grande ímpeto havia sido disparada a flecha que os três corpos do feroz Gerion foram atravessados. Com um agudo e desesperante gemido, o monstro se inclinou, depois caiu para não se levantar nunca mais.
Então Hércules conduziu para a Cidade Santa o brilhante gado colorido. Difícil foi a tarefa. Muitas vezes alguma rês se transviava e Hércules tinha que deixar a manada para ir à busca dos vagabundos errantes. Ele conduziu a manada através dos Alpes e dentro da Itália. Em qualquer lugar que a injustiça tivesse triunfado, ele assestava um golpe mortal aos poderes do mal e endireitava a balança a favor da justiça.
Quando Erix, o lutador, o desafiou, Hércules o derrubou tão violentamente que ali ficou. Da mesma forma quando o gigante Alcione lançou sobre Hércules uma rocha que pesava uma tonelada, este a aparou com sua clava e a lançou de novo para matar àquele que a havia enviado.
Às vezes se desorientava, porém Hércules sempre regressava, desandava seus passos e prosseguia seu caminho. Embora fatigado por este exigente trabalho, Hércules finalmente regressou.
O Mestre esperava sua chegada.
“Benvindo, Ó filho de Deus que és também filho de homem. A joia da imortalidade é tua, com estes doze trabalhos tu superaste o humano e ganhaste o divino. Chegaste ao lar, para não mais deixá-lo. No firmamento estrelado será inscrito teu nome, um símbolo para os lutadores filhos dos homens, de seu destino imortal. Terminados os trabalhos humanos, tuas tarefas cósmicas começam. “ (BAILEY, 2008)

d)    Comentário:
A obediência é a característica principal em Peixes. Obediência aqui não é apenas seguir ordens, mas manter disciplina para avançar em direção à conclusão dos objetivos.
Salvar a manada vermelha (que simboliza o povo que sofre na busca da libertação) e leva-la à Cidade Sagrada e durante seu trajeto alguns se desgarravam. Hércules ia ao encontro dos errantes e os conduzia de volta à manada: deve-se zelar por aqueles que se mantém na senda e ainda por aqueles que dela se afastam.
Quando chegam no Templo os bois são oferecidos em sacrifício e sua pele retirada, simbolizando a transcendência da materialidade humana (a pele removida).
Os bois simbolizam também a vida material e o gigante que os possui simboliza o apego do homem ao mundo material. Apenas pela morte do gigante que se apega ao mundo material se pode libertar o princípio espiritual do iniciado que o conduzirá à salvação.
Hércules não mata o pastor Euriton (inimigo interno), mas apenas domina os efeitos do ataque do seu cão (desejos, pulsão sexual descontrolada, vícios, etc). Por outro lado, Hércules mata o gigante Gerion, símbolo do materialismo.
O iniciado em peixes mais uma vez exercita sua capacidade de controlar os impulsos nocivos dos vícios sepultando as energias matérias para então buscar sua salvação, a qual passa invariavelmente pela salvação coletiva.
e)     Ilustração:

Figura 13: Hércules luta pela posse do gado tartéssico de Gerião

4.     A Revolução
Historicamente os conhecimentos esotéricos, que remetem ao conjunto de saberes necessário para o iniciado nos mistérios trilhar o caminho de sua senda evolutiva, são protegidos por símbolos e alegorias, especialmente por meio de lendas contadas de geração a geração, cuja interpretação era concedida àqueles que recebiam de seus mestres as chaves necessárias.
Na cultura grega a transmissão do conhecimento sagrado ocorreu, na antiguidade, por meio da propagação de uma série de lendas mitológicas que exigiam um conhecimento aprofundado de astrologia, alquimia e outras ciências iniciáticas restritas a poucos.
O decurso do tempo (inclusive por meio das múltiplas reencarnações segundo alguns) sempre foi a marca do percurso necessário à evolução espiritual. Neste sentido, os doze trabalhos de Héracles, dispostos ao longo do tempo decorrido na revolução do sol pelos signos zodiacais, simbolizam o interstício (cíclico por sinal) necessário à evolução do iniciado.
Bailey (2008) contribui em sua brilhante análise ao contar a antiga história que, por meio de uma revolução solar, transforma Alcides em Héracles. As vicissitudes de Héracles em seus doze trabalhos proporcionam uma visão transcendental (que supera o literalismo do texto mitológico) bem como uma série de realidades espirituais (relacionadas ao embate entre virtudes e vícios) que são experimentadas na senda do iniciado.
A Maçonaria, e em especial o Rito Escocês Antigo e Aceito, por ser um rito solar, cujo templo é justamente sustentado por doze colunas zodiacais, encontra estreita semelhança com a epopeia de Héracles em sua trajetória evolutiva: desde o recebimento da luz (conjunto de saberes ocultos) até se tornar um portador da luz (em analogia à exaltação do Mestre).
A epopeia de Héracles é a síntese simbólica da luta da alma em busca da liberação de si mesmo pela exaltação de características da personalidade superiores e pelo controle de energias mais selvagens em prol da evolução integral de si mesmo e da humanidade.
“Ele (Hércules) representa o Filho de Deus encarnado, mas ainda imperfeito, que definitivamente toma em suas mãos a natureza inferior e, voluntariamente, submete-se à disciplina que fará emergir o divino que carrega consigo. É a partir do homem que falha, mas que é sinceramente sério e inteligentemente consciente do trabalho a ser realizado, que se forma um Salvador do Mundo”. (BAILEY, 2008).

         Neste sentido, a revolução solar (aí referida à trajetória do sol pelos signos, ou de Héracles pelos trabalhos), pressupõe pelo menos dois caminhos à evolução da alma humana:
“        1. Um lento e contínuo crescimento evolutivo, levado avante sob o efeito das Leis da Natureza, ciclo após ciclo, até que gradualmente o lado divino começa a se expressar no homem;
         2. Ou o resultado de sistemática aplicação e disciplina por parte do aspirante, que permite o desabrochar mais rápido do poder e vida da Alma. ” (NETTO, s.d., p.3)
Em quase todas as tarefas, ao realiza-las, uma nova constelação surgia nos céus em decorrência da ação de Héracles, a exemplo da constelação de Leo, originada a partir da realização do trabalho perante o Leão de Nemeia. Cada avanço nos trabalhos colocava mais luz nos céus (por novas constelações) de modo a iluminar Héracles em seu caminho.
Ao fim de sua trajetória, Hércules se torna portador da luz e, por isso, há igualmente uma constelação com seu nome no firmamento.
         Na Maçonaria, pode-se inferir a seguinte trajetória na senda do iniciado, segundo Carpes (2012):
Figura 14: 
 O caminho místico percorrido pelo iniciado
         Alcides, o que nasceu filho do maior dos Deuses comete o pior dos crimes ao assassinar sua família. Submete-se aos desígnios da sentença do Oráculo e se humilha ao se submeter às ordens do Rei Eristeu. Empreende uma longa jornada, onde se instrui a partir das experiências no embate com os outros e especialmente consigo mesmo. Inicia a expiação buscando salvar-se a si mesmo e a conclui como salvador da humanidade. O sol que se põe na escuridão do facínora Alcides é o mesmo que se levanta na trajetória solar do herói Héracles. Um mesmo sol, em revolução sobre os diversos aspectos da persona, sepultando vícios e iluminando virtudes, na melhor forma de se renovar a cada ciclo completo. Alcides e Héracles, um mesmo homem, um só sol e uma só trajetória: a revolução de si mesmo.
“É o mesmo sol que derrete a cera e seca a argila” ( Antoine de Saint-Exupéry )

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AUBRETON, Robert. Introdução a Hesíodo. São Paulo: USP, 1956.
BAILEY, Alice A. Os trabalhos de Hércules. Niterói: Fundação Cultural Avatar, 2008.

HOMERO. Ilíada. Tradução de Frederico Lourenço. Lisboa: Cotovia, 2005.

NETO, Alfredo Roberto. Os doze trabalhos de Hércules e a evolução da alma. Visão Esotérica. São Paulo, s.d., p.2. Disponível em http://minhateca.com.br/jubarodrigo/Ocultismo/Os+Doze
+Trabalhos+de+Hercules,159038658.pdf; acesso em 23 Abril 2017.

PROUST, Marcel. Em Busca do Tempo Perdido: no caminho de Swann. Vol. 1. São Paulo: Globo, 2006

RIBEIRO JR., W.A. Os doze trabalhos de Héracles. Portal Graecia Antiqua, São Carlos. Disponível em
http:// greciantiga.org/arquivo.asp?num=0035 ; acesso em 23 Setembro 2017.

RODRIGUES, João Anatalino. Mestres do Universo. São Carlos: Recanto das Letras, 2010. Disponível em http://www.joaoanatalino.recantodasletras.com.br/visualizar.php?idt=188190 3>; acesso em 24 setembro 2017

SAMPSON, Walter H. Zodiac: a life epitome. Montana: Kessinger Publishing, 2003. Disponível em <https://phpthread.cf/pub/download-zodiac-life-epitome-0882310194-by-walter-h-sampson-pdf.html>; acesso em 24 Setembro 2017

STEPHANIDES, M. Hércules. Trad. MICHAEL, M. P. São Paulo: Odysseus, 2005.

URBANO JR., Helvécio de Resende. Templo maçônico: dentro da tradição kabbalística. São Paulo: Madras, 2012.


[1] Especial de Astrologia (Parte I de III). Disponível em <http://profeciasoapiceem2036.blogspot.com.br/2016/01/especial-astrologia-parte-i-de-iii.html>; acesso em 23 Setembro 2017
[2] Os  doze trabalhos de Hércules, As Éguas de Diomedes. Disponível em < http://wings-of-fairy.blogspot.com.br/2017/03/contos-os-doze-trabalhos-de-hercules-as.html>; acesso em 26 setembro 2017
[3] Hércules dominando o Touro de Creta. Disponível em < http://mitographos.blogspot.com.br/2015/11/hercules-os-doze-trabalhos-o-touro-de.html>; acesso em 26 Setembro 2017
[4] Hercules Slaying The Dragon In The Garden Of The Hesperides. Disponível em < https://fineartamerica.com/featured/hercules-slaying-the-dragon-in-the-garden-of-the-hesperides-peter-paul-rubens.html> ; acesso em 26 Setembro 2017
[5] Hércules e a Corça, estátua em bronze de Giambologna. Disponível em
[6] STEPHANIDES, M. Hércules. Trad. MICHAEL, M. P. São Paulo: Odysseus, 2005.
[7] O cinto de Hipólita. Disponível em < http://mitologia.blogs.sapo.pt/heracles-ou-hercules-e-o-cinto-de-140610>; acesso em 27 Setembro 2017
[8] Hércules e o Javali do Erimanto. Disponível em
 < http://mitographos.blogspot.com.br/2015/10/hercules-os-doze-trabalhos-o-javali-do.html> ; acesso em 27 Setembro 2017
[9] Hércules e a Hidra de Lerna. Disponível em < http://mitographos.blogspot.com.br/2015/10/hercules-os-doze-trabalhos-hidra-de.html> ; acesso em 27 Setembro 2017.
[10] Hércules e as aves, tapeçaria do século XVI. Disponível em
[11] Hércules e o cão de três cabeças Cérbero. Disponível em <https://br.pinterest.com/pin/812266482763981384/>; acessível em 27 Setembro 2017
[12] Os estábulos do Rei Áugias. Disponível em
[13] Hércules luta pela posse do gado tartéssico de Gerião. Disponível em < http://arturjotaef-numancia.blogspot.com.br/2012/12/hercules-geriao-10-trabalho-de-hercules.html> ; acesso em 27 Setembro 2017
[14] O caminho místico percorrido pelo iniciado in A Revolução Solar e os Signos Zodiacais – Maçonaria & Astronomia, apresentação de Flávio Carpes Moraes de 2012.

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